CLASSE DE JOVENS- 1º TRI-2018-LIÇÃO 01.


SÍNTESE : O objetivo principal do Evangelho de Mateus é mostrar que Jesus é o Messias que foi anunciado pelos profetas no Antigo Testamento. “Livro da geração de Jesus Cristo, Filho de Davi, Filho de Abraão.”
A GENEALOGIA DE JESUS, 1.1-17

1. Quem foi Jesus (1.1)
Como pode ser observado na introdução, Mateus escreveu o seu Evangelho especificamente para os judeus. Portanto, é muito natural que ele devesse começar pela genealogia. Particularmente após o cativeiro na Babilônia, os judeus passaram a dar muita ênfase sobre os devidos registros genealógicos. Isso é realçado na longa lista de gerações nos primeiros nove capítulos do primeiro livro de Crônicas. O livro de Neemias conta como alguns levitas foram retirados do sacerdócio porque não puderam indicar as suas genealogias (Ne 7.63-65). Obviamente, Jesus não poderia ser aceito como o Messias, a não ser que pudesse haver uma comprovação por meio de registros genealógicos de que Ele era o filho de Davi, pois os judeus acreditavam que o seu Messias viria da linhagem real do maior dos reis de Israel, e que nasceria em Belém, a cidade natal de Davi (veja 2.4-6).
Jesus foi primeiramente identificado como Cristo. Esse termo vem da palavra grega christos, que é o equivalente do hebraico mashiah (Messias). As duas palavras significam "o consagrado" ou "o ungido". Jesus é o equivalente do hebraico yehoshua (Josué) na sua forma posterior yeshua. A palavra significa "Jeová irá salvar". Dessa forma, a Pessoa Suprema deste Evangelho de Mateus é identificada como o Salvador-Messias. Mas na época em que foi escrito o Evangelho de Mateus, Jesus Cristo passou a ser usado como um nome próprio.

SEGUNDA – Mt 1.1- Jesus é da descendência davídica.
1.1 Registro dos ancestrais de Jesus, o Messias. Os dezessete primeiros versículos do Evangelho de Mateus apresentam os ancestrais de Jesus. Como a linhagem de uma família servia para provar que ela pertencia ao povo escolhido de Deus, Mateus começou mostrando que Jesus era descendente (ou "filho'') de Davi, que era descendente de Abraão (versão NTLH), cumprindo assim as profecias do Antigo Testamento sobre a linhagem do Messias (a expressão "pai de" também pode significar "ancestral de"). Mateus traçou a genealogia de Jesus até Abraão, através de José. Essa genealogia comprova a linhagem legal (ou real) de Jesus através de José, que era descendente do rei Davi (veja também 2 Sm 7.16; Is 9.6,7; Ap 22.16).



TERÇA – Mt 1.2 - A genealogia de Jesus começa por Abraão.
1.2 Abraão gerou a ("era o pai de") lsaque. A frase "era o pai de" também pode significar "era o ancestral de". Dessa forma, não havia necessidade de haver um relacionamento direto entre o pai e o filho entre rodos aqueles que estavam relacionados numa genealogia. Na antiguidade, as genealogias eram muitas vezes arranjadas de forma a ajudar a memorização. Assim, Mateus registrou sua genealogia através de três conjuntos de quatorze gerações (veja 1.17). Abraão foi chamado por Deus, recebeu as promessas da aliança, e creu que Deus iria manter   as  suas  promessas   (Gn   15.6).  Sua história é contada em Gênesis 11-25. Abraão gerou a  /saque. Abraão  e Sara queriam  saber se Deus lhes enviaria o filho prometido;  mas Deus sempre cumpre as suas promessas. Veja Gênesis 21-22.


QUARTA – Mt  1.16 - A descendência davídica de Jesus é herdada por meio de seu pai terreno, José.
1.16 A linhagem real continuou através de José que, embora não fosse o pai de Jesus, era o marido de Maria, da qual nasceu Jesus, que se chama o Cristo. Mateus havia terminado seu objetivo de relacionar essa genealogia para mostrar, sem qualquer dúvida, que Jesus era descendente de Davi e que, dessa forma, estava cumprindo as promessas de Deus.

QUINTA – Mt 5.17- Jesus veio para cumprir a Lei e os profetas.
5.17 Jesus não veio como um rabino trazendo um ensino recém elaborado, Ele veio como o prometido Messias com uma mensagem que fora transmitida desde o início dos séculos. "Não cuideis que vim destruir a lei ou os profetas; não vim ab-rogar, mas cumprir". Jesus completa e transcende a lei. A lei do Antigo Testamento não foi rescindida e deve ser agora interpretada e reaplicada à luz de Jesus. Deus não mudou de idéia e a vinda de Jesus fazia parte do plano de Deus para a Criação (veja Gênesis 3.15)


SEXTA - Mt 16.18 - Mateus é o único dos evangelistas que menciona a Igreja.
16.18 O nome Pedro já tinha sido dado a Simão quando Jesus o encontrou pela primeira vez ( Jo 1.42). Aqui Jesus deu ao nome um novo significado. Jesus disse: "Tu és Pedro lpetros em grego] e sobre esta pedra lpetra em grego] edificarei a minha igreja". Embora seja evidente o jogo de palavras, a que se refere esta pedra? A "pedrà' sobre a qual Jesus edificará a sua igreja foi identificada de quatro maneiras principais:


1. O próprio Senhor Jesus, como o arquiteto divino da nossa fé, e Ele mesmo como a pedra fundamental. Mas alguns pensam que esta verdade não parece ser o que se quer dizer aqui. Eles entendem que o foco estava em Pedro.

2. Pedro, como o supremo líder, ou primeiro "bispo" da igreja, uma versão incentivada por estudiosos  católicos romanos. Esta versão dá autoridade à hierarquia da sua igreja e considera Pedro e cada um de seus sucessores como o supremo pontífice da igreja. Não há menção a sucessão nestes versículos, entretanto, e embora a igreja primitiva expressasse grande consideração por Pedro, não há evidências de que eles o considerassem como a autoridade mais elevada.
3. A confissão de fé que Pedro fez, e que todos os verdadeiros crentes subseqüentes também fazem. Esta visão foi apresentada por Lutero e pelos reformadores como uma reação à segunda visão, expressa acima.

4. Pedro como o líder das discípulos. Da mesma maneira como Pedro revelou a verdadeira identidade de Cristo, o Senhor também revelou a identidade e o papel de Pedro.
Embora a sucessão apostólica não possa ser encontrada neste contexto, nem nas epístolas, o papel de Pedro como um líder e porta-voz da igreja não deve ser desconsiderado. Pedro recebeu a revelação do discernimento e da fé a respeito da identidade de Cristo, e foi o primeiro a confessar a Cristo.


SÁBADO – Mt 28.18-20 - A Igreja é chamada para cumprir as ordenanças de Jesus.
28.18-20 Quando alguém está morrendo ou nos deixando, nós prestamos atenção às suas últimas palavras. Jesus deixou os discípulos com algumas últimas palavras de instrução. Deus deu a Jesus todo o poder sobre o céu e a terra. Com base neste poder, Jesus disse aos seus discípulos ide e fazei discípulos (versão RA), pregando, batizando e ensinando. "Fazer discípulos" significa educar novos crentes sobre como seguir a Jesus, submeter-se à soberania de Jesus e assumir a sua missão de serviço misericordioso. Batizar é importante porque une o crente a Jesus Cristo em sua morte para o pecado, e em sua ressurreição para uma nova vida. O batismo simboliza a submissão a Cristo, a disposição para viver segundo a vontade de Deus, e a identificação com o povo da aliança de Deus. Batizar em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo é um gesto que afirma a realidade da Trindade, o conceito que veio diretamente do próprio Senhor Jesus. Ele não disse para batizar "nos nomes", mas "em nome" do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo.

Embora em missões anteriores Jesus tivesse enviado os discípulos somente aos judeus (10.5,6), a sua missão a partir de então seria a todas as nações. Isto é chamado de Grande Comissão. Os  discípulos tinham sido bem treinados, e tinham visto o Senhor ressuscitado. Eles estavam preparados para ensinar as pessoas de todo o mundo a guardar todas as coisas que Jesus tinha mandado. Isto também mostrava aos discípulos que haveria um período entre a ressurreição de Jesus e a sua segunda vinda. Durante este período, os seguidores de Jesus tinham uma missão a cumprir - evangelizar, batizar e ensinar as pessoas a respeito de Jesus para que elas, por sua vez, pudessem fazer a mesma coisa. As boas novas do Evangelho deveriam ser transmitidas a todas as nações.
Com este mesmo poder e autoridade, Jesus ainda nos ordena que contemos a outros sobre as boas-novas, e os façamos discípulos do reino. Nós devemos ir - seja à porta ao lado ou a outro país - e fazer discípulos. Esta não é uma opção, mas um mandamento a todos os que chamam Jesus de "Senhor". Quando obedecermos, sentiremos conforto sabendo que Jesus está conosco todos os dias. Isto irá acontecer por meio da presença do Espírito Santo na vida dos crentes. O Espírito Santo será a presença de Jesus que nunca os deixará (Jo 14.26; At 1.4,5). Jesus continua a estar conosco hoje, por meio do seu Espírito. Da mesma maneira como este Evangelho se iniciou, ele termina - Emanuel, "Deus conosco" (1.23).

As profecias do Antigo Testamento e as genealogias do livro de Mateus apresentam as credenciais de Jesus que o qualificam para ser o Rei do mundo - não um líder militar ou político, como os discípulos originalmente tinham esperado, mas o Rei espiritual que pode derrotar todo o mal e governar no coração de cada pessoa. Se nos recusarmos a servir fielmente ao Rei, seremos súditos desleais. Precisamos fazer de Jesus o Rei da nossa vida, e adorá-lo como nosso Salvador,Rei e Senhor.


EXTRAÍDO DOS  LIVROS:
COMENTÁRIO BÍBLICO BEACON.
COMENTÁRIO DO NOVO TESTAMENTO APLICAÇÃO PESSOAL.

CLASSE ADULTO- LIÇÃO 01 - 1º TRI - 2018 - A Carta aos Hebreus e a excelência de Cristo

Extraído do livro: A supremacia  de Cristo , Fé, esperança  e ânimo na carta aos Hebreus.
José Gonçalves

Comentário de Hebreus 1.1-14

         Fugindo das características que são comuns na abertura· de uma carta ou epístola, o autor vai diretamente ao assunto que ele quer tratar. No original, é possível perceber a beleza da sua construção literária ainda nas primeiras linhas. Neil R. Lightfoot observa que, já na abertura de seu texto, o autor antecipa tudo o que se seguirá, Ele mostrará a supremacia da fé cristã em relação ao judaísmo primitivo.
"Havendo Deus, antigamente, falado, muitas vezes e de muitas maneira  aos pais, pelos profetas, a nós falou-nos, nestes últimos dias, pelo Filho" (v. 1).
Os profetas eram os arautos de Deus para o povo de Israel. A Instituição Profética no Antigo Testamento é por demais importante para ser minimizada. Para um judeu, a pior desgraça que poderia existir era o silêncio profético.

A trombeta profética servia de alerta quando a vida moral, a espiritual e a social não iam bem. Abraham Joshua Heschel (1907-1972), famoso rabino austro-americano, escreveu sobre a importância dos profetas:
"O significado dos profetas de Israel não reside apenas no que eles disseram, mas também no que eles foram. Não podemos entender completamente o que eles pretendiam dizer a nós, a menos que tenhamos algum grau de consciência do que lhes aconteceu. Os momentos que passaram em suas vidas não estão agora disponíveis e não podem se tomar objeto de análise científica. Tudo o que temos é a consciência desses momentos como preservados em palavras [...]. O profeta faz pouco caso daqueles para quem a presença de Deus é auxílio e segurança; para ele, é um desafio, uma exigência incessante. Deus é compaixão, não concessão; justiça, embora não inclemência. A palavra do profeta é um grito na noite. Enquanto o mundo dorme despreocupado, o profeta sente o golpe vindo do céu".
O autor de Hebreus tem consciência desse fato - os profetas foram arautos de Deus para o seu antigo povo. Todavia, uma voz superior a deles fora levantada - a voz do Filho de Deus! Essa voz era em tudo superior a dos profetas. Os profetas foram agentes da revelação divina, mas não foram a revelação final. O autor lembra que essa revelação final, a última palavra profética, era do Filho de Deus. Nenhum profeta, por mais importante que tivesse sido, poderia igualar-se em importância com Jesus Cristo.
A ideia, aqui, não é que Deus não falaria mais a partir daquele momento, como nos quer fazer acreditar alguns autores, mas, sim, mostrar Jesus Cristo como sendo o cumprimento de tudo aquilo que foi predito pelos profetas.  Adam Clarke (1760-1832) comentou com muita propriedade que:
"Debaixo do Antigo Testamento, as revelações foram feitas em ocasiões distintas por várias pessoas, em diversas leis e forma de ensinamentos com diferentes graus de clareza, símbolos, tipos e figuras e com distintos modos de revelação, tal como por anjos, visões, sonhos, impressões mentais, etc.; veja Nm.12.68.  Todavia, debaixo do Novo Testamento, tudo está feito por uma só pessoa, quer dizer, Jesus, que cumpriu o que disseram os profetas e completou as profecias".

"A quem constituiu herdeiro de tudo, por quem fez também mundo" (v. 2). A palavra "herdeiro", que traduz o termo grego kleronomos, era usada em referência à divisão dos bens que um pai realizava em favor de seus filhos. No judaísmo antigo, esse termo foi usado para o lançamento de sortes para ser definido a quem caberia a parte da herança. A ideia é que Jesus Cristo, por ser o único Filho de Deus, tomou-se o herdeiro de tudo. Todavia, Ele não era apenas o herdeiro de tudo, mas também foi o agente da criação. Através dEle, os mundos foram criados. A palavra "mundo" traduz o termo grego aionas, com o significado de "eras'. O sentido é que Deus, em Cristo, criou o mundo com tudo o que nele há. Como bem destacou Efrén de Nisibi: "tanto o mundo espiritual como o material".
"O qual, sendo resplendor da sua glória, e a expressa imagem da sua pessoa, e sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder, havendo feito por si mesmo a purificação dos nossos pecados, assentou-se à destra da Majestade, nas alturas" (v. 3). Esse versículo compõe aquilo que os teólogos denominam de "cristologia alta". patrística valeu-se com frequência desse texto para afirmar a divindade de Cristo. Ainda muito cedo, Orígenes escreveu:

"A mim me parece que o Filho é um reflexo da glória de Deus, conforme ao que Paulo afirma: 'Ele é o reflexo de sua glória'. Deste reflexo de toda a gloria, reflete certamente os reflexos parciais que tem as demais criaturas dotadas de razão, pois penso que nada, exceto o Filho, pode conter o reflexo da glória do Pai em sua totalidade".

Por outro lado, Atanásio, em seu discurso contra os arianos, escreveu:

"Quem já viu uma luz sem resplendor? Ao escrever aos Hebreus, o apóstolo afirma: 'Cristo é o esplendor de sua glória e a marca de sua substância', e Davi, no Salmo 89, canta: 'O esplendor do Senhor, nosso Deus, está conosco', e também: 'Em tua luz, vemos a luz'. Quem é tão néscio que não entende que essas palavras referem-se à eternidade do Filho? Como pode alguém ver a luz sem o esplendor de sua irradiação para poder dizer a respeito do Filho: 'Houve um tempo no qual ele não existia' ou 'Não existia antes de ser gerado'? expressão do Salmo 144 refere-se ao Filho: "Teu reino é um reino eterno" e não permite a ninguém pensar em um intervalo cronológico, qualquer que seja, no qual o Logos não existia".

Em seu clássico e exaustivo comentário sobre a carta aos Hebreus, o puritano William Gouge (1575-1653) lança mais luz sobre o entendimento desse texto:

"Essa frase, a expressa imagem, é uma exposição da palavra grega χαρακτήρque pode ser traduzida como character (caráter). O verbo do qual essa palavra é derivada, charattein, insculpir, significa gravar, e aqui é usada com o sentido de carimbar ou imprimir alguma coisa gravada como a impressão sobre uma moeda; a impressão sobre o papel feita pela impressora; a marca deixada pelo selo".

Em outras palavras, aquilo que Deus é, Jesus Cristo também é.
"Feito tanto mais excelente do que os anjos, quanto herdou mais excelente nome do que eles" (v. 4). Tendo mostrado a dignidade do Filho de Deus e sua superioridade sobre o ministério profético, o autor passa a fazer um contraste entre Jesus e os anjos. A cultura judaica, representada tanto na literatura canônica como na apócrifa, dá um papel de destaque para as figuras angélicas. Os anjos frequentemente aparecem nas páginas do Antigo Testamento. O apóstolo Paulo advertiu a igreja de Colossos sobre os perigos de uma adoração angélica: "Ninguém vos domine a seu bel-prazer, com pretexto de humildade e culto dos anjos, metendo-se em coisas que não viu; estando debalde inchado na sua carnal compreensão" (Cl 2.18).
Em nenhum momento, o autor deprecia a instituição profética, nem tampouco procura desqualificar o papel dos anjos dentro do plano de Deus. seu foco, porém, é mostrar que ninguém, nem mesmo os anjos, que habitam os céus, pode ser maior do que o Filho de Deus. "A ideia é a de superioridade em dignidade, valor ou utilidade, sendo a ideia fundamental de poder, e não a de bondade".
"Porque a qual dos anjos disse jamais: Tu és meu Filho, hoje te gerei? E outra vez: Eu lhe serei por Pai, e ele me será por Filho" (v. 5 . Embora os anjos sejam chamados na Bíblia de "filhos de Deus" (Jó 1.6; 2.1), o Senhor, todavia, jamais os chama de "meus filhos". Essa expressão só é aplicada a Cristo conforme demonstra o Salmo 2. Aqui, não está presente a ideia de uma inferioridade do Filho em relação ao pai pelo fato de aquEle ter sido "gerado". Os cristãos neotestamentários não tinham problema algum com a divindade de Cristo, sendo que tais questionamentos foram disseminados em tempo posterior com a heresia ariana. Na cultura hebraica, as ideias por trás das palavras "Pai" e "Filho" não trazem o sentido de origem do ser e de superioridade, nem tampouco de subordinação e dependência. Da mesma forma, os termos "gerado" e "criado" não podem ser tidos como sinônimos. Loraine Boettner (1901-1990) observa que essas palavras trazem em si as "noções semíticas e orientais de semelhança igualdade de natureza igualdade do ser. Obviamente, a sensibilidade semítica é que sublinha a fraseologia das Escrituras, e, quando elas chamam Cristo de 'Filho de Deus', confirmam sua divindade verdadeira e apropriada. Isso indica uma relação peculiar que não pode ser afirmada a respeito de criatura alguma, nem tampouco compartilhada. Da mesma forma que qualquer filho humano assemelha-se ao pai em sua natureza essencial, isto é, possui humanidade, assim também Cristo, o Filho de Deus, era como o Pai em sua natureza essencial, isto é, possuía Divindade".
C. S. Lewis (1898-1963), o consagrado escritor britânico e autor de as Crônicas de Nárnia, em uma carta escrita a Arthur Greeves, disse que:

"Gerar é tornar-se pai; criar é fazer. A diferença é esta: quando você gera, gera algo da mesma espécie que você. Um homem gera bebês humanos, o urso gera filhotes ursos, e um pássaro gera ovos que se transformam em passarinhos. Mas quando você cria, faz algo de uma espécie diferente da sua. pássaro faz o ninho, o castor constrói um dique, o homem faz o telégrafo - ou talvez faça alguma coisa mais parecida consigo mesmo, como talvez uma estátua. Se for um escultor bem qualificado, pode fazer uma estátua bem parecida com um homem. Naturalmente, porém, ela não será um homem verdadeiro, apenas se assemelhando a ele. Ela é incapaz de respirar ou pensar. Não está viva. Essa é a primeira coisa a compreender. O que Deus gera é Deus; assim como o que o homem gera é homem. O que Deus cria não é Deus; da mesma forma que o que o homem cria não é homem. Daí a razão de os homens não serem filhos de Deus no mesmo sentido que Cristo. Eles podem assemelhar-se a Deus em certos aspectos, mas não pertencem à mesma espécie. Aproximam-se mais de estatuas ou figuras de Deus".

"E, quando outra vez introduz no mundo o Primogênito, diz: E todos os anjos de Deus o adorem" (v. 6). O autor põe em relevo a superioridade do Filho em relação aos anjos quando destaca que estes devem prestar­ -lhe adoração. A ideia, aqui, não é apenas de prestar uma homenagem como sugere o ensino ariano. O vocábulo grego proskyneo traz a ideia de prostrar-se e adorar.  Os intérpretes acreditam que o autor nessa citação fez uma combinação de Deuteronômio 32.43 com o Salmo 97.7 (96.7 LXX). Tanto o texto massorético em hebraico como o texto grego da Septuaginta traduzem as palavras histabãwüe proskyneo como adorar. "E, quanto aos anjos, diz: O que de seus anjos faz ventos e de seus ministros, labareda de fogo" (v. 7). A tradução "vento", e não "espírito", posta logo após o termo "anjos", conforme aparece na Almeida Revista e Atualizada, capta melhor o sentido do original. O sentido é que os anjos podem assumir tanto a forma de vento como de fogo! Por outro lado, a palavra "ministros" (gr. leitourgeo) dá a ideia de alguém a serviço de outrem. Os anjos são seres a serviço de Deus.
"Mas, do Filho, diz: Ó Deus, o teu trono subsiste pelos séculos dos séculos, cetro de equidade é o cetro do teu reino" (v. 8). Aqui, o autor faz uma referência ao Salmo 45. Precisamos enxergar o caráter messiânico desse salmo se quisermos, de fato, entender o pensamento do autor. Em seu comentário do Novo Testamento, Joseph Benson (1749-1821) observa que essa citação só tem sentido quando aplicada a Cristo. 12 Somente Ele pode ser chamado de Deus. Archibald Thomas Robertson (1863-1934), da mesma forma, vê nesse texto uma afirmação da divindade de Cristo. Robertson observa que "essa citação (a quinta) provém do Salmo 45.7ss. Uma ode nupcial hebraica (epithalamium) para um rei, que aqui é tratado como messiânico. Aqui, ho theos deve tomar-se como vocativo (dirige-se a palavra como na forma nominativa, como em João 20.28, onde o Messias é designado como Deus; cf. Jo 1.18 )".13 "Amaste a justiça e aborreceste a iniquidade; por isso Deus, o teu Deus, te ungiu com óleo de alegria, mais do que a teus companheiros" (v. 9). Eusébio de Cesareia (263-339 d.C.) destaca:

"aqui, o primeiro versículo do texto o chama de Deus; o segundo o honra com o cetro real. E a continuação depois de seu poder divino e régio mostra o mesmo Cristo, em terceiro lugar, ungido não com óleo que procede de matéria corporal, senão com o óleo divino do gozo, pelo que vem significar sua excelência, sua superioridade e sua diferença em relação aos antigos, ungidos mais corporalmente e em figura".

"E: Tu, Senhor, no princípio, fundaste a terra, e os céus são obra de tuas mãos" (v. 10). Com sua mente no Salmo 102.25-27 e sempre seguindo a Septuaginta, o autor descreve a exaltação de Cristo, que é retratado aqui como Senhor e Criador. Para o autor, uma das inúmeras razões da superioridade de Jesus sobre os anjos é que Cristo não é uma criatura, mas, sim, o próprio Criador de tudo o que há. Essas palavras fazem um paralelo com Colossenses 1.16 e João 1.3.
"Eles perecerão, mas tu permanecerás; e todos eles, como roupa, envelhecerão" (v. 11). Em contraste com o mundo que passará, Jesus permanecerá para sempre.
"E, como um manto, os enrolarás, e, como uma veste, se mudarão; mas tu és o mesmo, e os teus anos não acabarão" (v. 12). O autor põe em relevo as metáforas para contrastar a transitoriedade do mundo criado com a eternidade do Filho. Em seu comentário sobre Hebreus, James Moffat (1879-1944) escreveu: "O mundo desgasta-se, e até mesmo os céus (12.26) são abalados, e com ele as luzes celestiais, mas o Filho permanece. A natureza está a sua mercê, e não Ele à mercê da natureza".
"E a qual dos anjos disse jamais: Assenta-te à minha destra, até que ponha os teus inimigos por escabelo de teus pés?" (v. 13). Aqui, a figura é de um monarca sendo honrado diante de seus súditos. O assento da direita revelava posição de honra. Por outro lado, no Oriente, era costume dos vencedores colocar o pé no pescoço dos vencidos (Js 10.24). Nenhum dos anjos ocupou uma posição de honra semelhante àquela ocupada por Jesus. A expressão assenta-te, que traduz o grego kathou, está no presente contínuo e descreve o estado permanente da grandeza e supremacia de Jesus para todo o sempre.
autor está próximo de introduzir outra seção na sua argumentação, mas ele precisa concluir sobre aquilo que ele havia argumentado sobre a superioridade do Filho em relação aos anjos. Os anjos são servos de Deus, Jesus é Filho e Senhor; os anjos não têm trono, o Filho tem. Os anjos são servos a serviço da salvação; o Filho é o autor da Salvação. "Não são, porventura, todos eles espíritos ministradores, enviados para servir a favor daqueles que hão de herdar a salvação?" (v. 14). O versículo 14 conclui o que o autor tencionava fazer ao contrastar a pessoa de Jesus com os anjos. Ficou meridianamente claro que o Filho de Deus é superior aos anjos em tudo. Os anjos estão a serviço da soberania divina no seu projeto redentivo. "Afinal, o que são os anjos?", pergunta Stuart Olyott.

"Não são pessoas da Divindade. São espíritos criados que foram enviados por Deus, não somente para servi-lo, mas também para servir os cristãos. Quão revelador e confortante é isso! Em alguns momentos parecemos tão rebaixados e os anjos aparecem tão poderosos. Mas nós é que herda­ remos a salvação, não eles. Embora já estejamos salvos, a consumação final de nossa salvação (o corpo ressurreto, a absolvição pública no juízo final, as glórias celestiais, etc.) ainda nos aguarda. Os anjos já estão tão elevados o quanto é possível; nós ainda aguardamos a glorificação final, quando "julgaremos os próprios anjos" (1 Co 6.3 ). Mas jamais poderemos nos comparar em glória com nosso Senhor Jesus Cristo. Muito menos os anjos podem ser comparados a ele! Por que, então, alguém é tentado a deixá-lo e retomar a uma religião centrada em um conjunto de regras dadas por meio de intermediários angélicos?".

“SUBSÍDIO LIÇÃO 14” - VIVENDO COM A MENTE DE CRISTO.

Extraído do livro: A obra da Salvação.
Autor da obra: Claiton  Ivan Pommerening.
                 
As principais características da mente de Cristo estão evidenciadas em Filipenses 2.5-8, bem como em 1 Coríntios 2.16. No primeiro texto, refere-se ao seu esvaziamento da condição divina assumindo todas as dimensões e características humanas, num gesto de extrema humildade, submissão, obediência e sacrifício com o objetivo de concretizar a salvação humana. No segundo texto, Paulo tem em vista as atitudes, as palavras e as ações tomadas por aqueles que vivem a lei do amor, porque não agem nem reagem de maneira natural às circunstâncias da vida, mas em tudo realizam movimentos que impressionam pela singularidade da manifestação de Deus através desses gestos, pois não levam em conta o egoísmo e o individualismo, tão comuns na sociedade, mas, sim, o altruísmo e a benevolência.

HUMILDADE: O SENTIMENTO DE CRISTO
Há um grande desafio quando se explica o que é humildade, pois parte-se do princípio de que quem fala sobre esse assunto é humilde, mas nem sempre isso acontece. Geralmente, fala-se do que se quer ser ou alcançar, como é o caso aqui. A origem da palavra vem de humus, que significa solo, terra; aquele que está equiparado a terra, pois provém dela. Humano deriva-se da palavra humus, significando que a principal característica humana é ser humilde, em contrapartida ao querer ser Deus. Quando os seres humanos pretensamente invadem essa dimensão, que não lhes pertence, incorrem no mesmo erro de Adão e Eva influenciados por Lúcifer. Isso é teologicamente chamado de hybris, quando o ser humano, ao invés de ter sua centralidade em Deus e depender dEle, desloca-a para si mesmo, autoinvestindo-se da prerrogativa divina. Somente Cristo pôde ser as duas coisas ao mesmo tempo sem que isso aniquilasse a estrutura do seu ser. Quando as pessoas assumem esse lugar, elas automaticamente caminham para a autodestruição de seu ser, porque, sendo humanos, é-lhes impossível serem Deus. Somente Ele pode ser o todo centrado em si mesmo. A diferença é que não significa ser orgulhoso ou vaidoso para Ele como seria para os seres humanos, pois Ele é o único ser completo e perfeito. Portanto, deve centrar-se em si mesmo, pois não há outro ser no qual Ele possa afirmar-se para ser. Ele é o todo e o tudo; Ele pode tudo. Amar a Deus sobre todas as coisas é deixar que toda glória seja dEle.
Quando Lúcifer quis ser alguém, ele não levou em conta que havia outro alguém maior. Portanto, a individuação do seu eu levou-o à sua ruína. Por isso, o orgulho é considerado, em algumas teologias, o pecado dos pecados, pois dá origem a todos os demais pecados. O problema do orgulho é que este supervaloriza o eu em detrimento do outro, e ninguém consegue ser alguém a não ser que se deixe interagir com outros. O orgulho é um pecado solitário porque o orgulhoso sempre quererá ficar acima dos outros e sempre quererá olhar para os outros de cima para baixo. Ele não consegue olhar para cima, não precisa de Deus, mesmo achando que está com Ele. O orgulhoso, por ser solitário, tem um ego absoluto, pensa saber mais que os outros, acha-se melhor do que todos e não aceita ser criticado ou contrariado. Ele precisa ser agradado sempre. Nos relacionamentos, o orgulhoso aniquila o outro e sempre exige do outro além do que ele pode dar. Por isso, o orgulho sempre é competidor e dificilmente consegue pedir perdão, pois ele pensa que nunca erra.
Geralmente, por trás de uma virtude, há um orgulho velado por ser quem é. Assim, a virtude pode tornar-se um vício por alimentar o orgulho. Sendo assim, o orgulho pode atingir a qualquer um e normalmente está mais presente do que se possa imaginar. Pode estar desde o púlpito da igreja até o mais simples e pretensamente humilde crente. No púlpito, pode estar presente em testemunhos mirabolantes irreais de pessoas que se gabam de como a vida dá certo em todas as coisas e de como é um sucesso em tudo. Pode estar por trás de uma pretensa espiritualidade desencarnada e de uma humildade impressionista fabricada.
Quem, a todo custo, aspira à fama e o reconhecimento acaba deixando de lado a ética e o respeito, pois, para alcançar a fama, torna-se aceitável ferir, lograr, manipular e mentir. Atrás da fama, vem o poder e o orgulho, e esses destroem relacionamentos, a confiança, o diálogo e a integridade.   Quando se atinge a fama e o poder, a pessoa geralmente se convence de que o que faz é igual ao Reino de Deus e que qualquer pessoa que se oponha estará errada e sendo usada pelo Diabo. Atinge-se, assim, um estado de falsa perfeição (At 12.21-23).   Jesus foi tentado a começar o ministério com fama : “Então o diabo o transportou à Cidade Santa, e colocou-o sobre o pináculo do templo, e disse-lhe: Se tu és o Filho de Deus, lança-te daqui abaixo; porque está escrito: Aos seus anjos dará ordens a teu respeito, e tomar-te-ão nas mãos, para que nunca tropeces em alguma pedra” (Mt 4.5-6). Mas Ele venceu essa tentação com uma determinação certeira à humildade. Não acalentou pensamentos de possibilidade de executar tal ato orgulhoso, mas, sim, combateu-o pela raiz com a Palavra de Deus: “Também está escrito” (Mt 4.7).
É a cruz de Cristo que inverte a ordem das coisas, porque Deus Filho não precisava humilhar-se, mas Ele o fez (Fp 2.5ss). Humildade nada mais é do que reconhecer nossa humanidade. Querer ser humilde é ser humano, querer ser como Deus é maligno. Humildade não é um pensamento altruísta apenas; também não é um sentimento de inferioridade em relação aos outros, mas, antes, um estilo de vida em que a identidade do crente é estabelecida a partir do modelo do Cristo encarnado. Não parte somente do modelo do Christus Victor, o sempre vencedor e vitorioso, que está triunfantemente assentado à destra do Pai, que foi colocado acima de todo principado e potestade; modelo este que serve de base para o crente vencer o pecado e Satanás. Mas parte especialmente do modelo do Cristo humilde e sofredor, que fez a vontade do Pai de maneira submissa, sem se impor sobre ninguém, mas, ao mesmo tempo, sem se deixar manipular ou subjugar a qualquer forma de escravidão, às estruturas religiosas, culturais, econômicas ou sociais.
A Bíblia afirma que é a humildade que precede a honra (Pv 15.33; 18.12); que é com os humildes que está a sabedoria (Pv 11.2); Deus exalta o humilde e humilha o soberbo (Ez 21.26). Os apóstolos aconselharam a serem todos humildes uns para com os outros, porque “Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (1 Pe 5.5); e com humildade, cada um considere os outros superiores a si mesmo (Fp 2.3). Jesus tornou bem-aventurado o humilde de espírito, porque dele é o Reino dos céus (Mt 5.3). Nesse sentido, outra versão da Bíblia afirma: “Abençoados são vocês, que nada mais têm para oferecer. Quando vocês saem de cena, há mais de Deus e do seu governo”. A humildade é condição primeira para que Deus possa realizar sua obra na vida do crente, conforme Isaías afirmou: “Em um alto e santo lugar habito e também com o contrito e abatido de espírito, para vivificar o espírito dos abatidos e para vivificar o coração dos contritos” (Is 57.15).
Paulo afirmou que pode haver apenas um motivo de orgulho: “Mas longe esteja de mim gloriar-me, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim e eu, para o mundo” (Gl 6.14). Entretanto, esse aparente orgulho de Paulo nada mais é do que estar crucificado com Cristo, que é a única maneira de vencer o orgulho, pois a cruz aponta para o que é humilhante e vil, para os nossos pecados levados sobre Cristo, para o estado em que não pertencemos mais a nós mesmos, mas unicamente a Cristo, onde o orgulho, de fato, é vencido. “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou e se entregou a si mesmo por mim” (Gl 2.20).
Viver em humildade é saber valorizar o outro sem perder a própria dignidade. Assim, tem-se a possibilidade de permanecer com o coração puro e altruísta. A humildade revela bom senso, sempre será bem vista, tem capacidade de gerar coisas novas e boas nos outros, consegue persuadir mais facilmente e tem o poder de inspirar outros a seguir a Cristo.
SERVIÇOS E CUIDADOS: A MENTE DE CRISTO
As atitudes de qualquer pessoa revelam seu estado mental; por mais que alguém tente disfarçar o mal, em algum momento ele aparecerá. Ter a mente de Cristo é desenvolver os mesmos pensamentos e atitudes que Ele teve. Não se trata apenas de uma aquiescência mental ou desejo esporádico, mas de um estilo de vida, de uma reordenação dos pensamentos, das vontades, dos desejos e das atitudes, no sentido de refletirem a pessoa de Cristo (Jo 13.15).
Organizar a vida em torno desse modelo de Cristo é desenvolver empatia e compaixão para com todos os que sofrem e necessitam da misericórdia divina, mesmo para com os inimigos e opositores. Essa atitude não é fácil, mas Jesus agiu assim com aqueles que se levantaram contra Ele quando bradou na cruz: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23.34).
Jesus usou sua autoridade para abençoar as pessoas, não para ser servido (Mt 20.28). Sua autoridade era a exsousia, no sentido de alargar e ampliar as possibilidades humanas, e era exercida para beneficiar as pessoas, e não para prevalecer, disputar ou subjugá-las. Seu poder era exercido a favor das pessoas, alargando suas possibilidades de ser e de atuar. Essa forma de poder e autoridade é uma das mais usadas no Novo Testamento  e aparece 108 vezes. Já o sentido do verbo kratós, como poder e dominação exercidos pela força, no sentido físico ou por imposição moral,  nunca é atribuído a Jesus, e Ele argumenta contra o seu uso (Mc 10.41-43).
A chave hermenêutica para compreender a mente de Cristo nos evangelhos é aprender a observar delicadamente as atitudes, palavras e milagres de Jesus como gestos de cura, perdão e acolhimento, e não somente sob a ótica de moralismos ou religiosidades; não que isso não esteja presente porque também são necessárias. No contexto em que Paulo define que devemos ter a mente de Cristo, ele afirma que “o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente. Mas o que é espiritual discerne bem tudo, e ele de ninguém é discernido” (1 Co 2.14-15). Significa que, para ter a mente de Cristo, é necessária essa hermenêutica do Espírito Santo, que abre os olhos às realidades antes não percebidas.
Assim, Ele deseja ver as pessoas livres de regras religiosas que tiram a vida (Mc 2.27);  o coração deve estar livre de ídolos, pois acabamos nos tornando exatamente como os ídolos que veneramos (Lc 12.34). Jesus é capaz de gestos carinhosos para curar (Lc 4.39). Ele chamou o homem da mão mirrada para o meio, ensinando que quem quer fugir de seus problemas precisa aprender a encará-los (Mc 3.4-5). Os sobrecarregados pelos fardos da vida são chamados a olharem (prosphonein – falar olho no olho) para Jesus e andarem eretos (Lc 13.10-13). Prova disso foi quando Ele defrontou-se com o paralítico no tanque de Betesda e perguntou-lhe: “queres ficar são?”. Cristo quer libertar-nos de comodismos, medos e do aparente benefício que o sofrimento pode trazer (Jo 5.5-9); o contato com Deus isenta-nos da contaminação, mesmo quando precisamos tocar nas enfermidades das pessoas (Mc 1.40-42). Na cura dos dez leprosos, Jesus quer que percebamos o extraordinário da transformação cotidiana mesmo fazendo o que é ordinário, além de ensinar-nos a sermos gratos pelo ordinário, ainda que seja difícil cumprir certas liturgias engessadas e costumes ultrapassados (Lc 17.11-16); descobrir quem de fato ocupa o coração humano, porque quem não sabe quem é perdeu a sua identidade, e esta precisa ser restaurada (Mc 5.68). A pergunta de Jesus ao cego Bartimeu (“que queres que te faça?”) instiga-o a largar o manto, que servia de máscara na qual se escondia. A pergunta de Jesus fez com que o cego entrasse em contato consigo mesmo e com o anseio mais profundo da sua alma (Mc 10.49-51). Jesus, em outro momento, separa o surdo-mudo da multidão, num gesto de respeito à individualidade e intimidade, e dá atenção especial num espaço protegido dos críticos e censuradores. Jesus, então, cospe e coloca um pouco de saliva na língua do homem, mas Ele percebe a impossibilidade de aquele surdo-mudo expressar-se. Jesus dá um suspiro abrindo o seu coração em luta por ele (Mc 7.32.35). Em outra ocasião, Ele toma outro cego pela mão e leva-o para longe do povo. Num espaço de confiança e individualidade, toca nos olhos de forma espantosa (saliva), porém carinhosa; depois lhe impõe as mãos e envia- o para sua casa — a casa do pai, onde é o nosso lugar, pois a cegueira pode impedir-nos de ir para casa (Mc 8.23-26). Enfim, nas inúmeras atitudes de Jesus, vimos seu desejo de servir e cuidar.
Não é um método específico que traz a solução, mas o encontro, o relacionamento, a sensibilidade para com cada um. Além dos gestos vistos anteriormente, Jesus utilizou-se do poder das palavras que curam e trazem vida. Através delas, Ele perdoou pecados, trouxe novas possibilidades de vida, apontou novos rumos e caminhos antes desconhecidos, consolou os que sofriam as mais terríveis dores da vida, trouxe esperança aos desalentados e espalhou uma cultura de amor.
Essas atitudes e palavras de Jesus, que também devem estar presentes na vida do cristão, é o que Paulo chama de homem espiritual em seu texto, aquele que entende as coisas do Espírito e sabe discerni-las bem, que não mede a si nem aos outros com as medidas do mundo, nem cogita das coisas do mundo, porque elas invertem a lógica do Reino de Deus, “porque
o Reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo” (Rm 14.17).
“Ora, o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente” (1 Co 2.14)
OBEDIÊNCIA: A VONTADE DO PAI
O ministério de Jesus foi pautado pela obediência ao Pai. Todas as suas ações eram uma realidade daquilo que Ele via o pai fazer. As suas palavras eram oriundas daquilo que Ele ouvia o Pai falar (Jo 5.19); não que Jesus fosse um robô autômato, mas, sim, que havia uma concordância com o Pai em tudo, pois Ele estava na terra em obediência ao Pai; portanto, para cumprir plenamente o eterno propósito divino, Cristo sujeitou-se completamente em obediência. Ele sabia que a vontade do Pai era boa, agradável e perfeita (Rm 12.2), e isso lhe dava segurança e tranquilidade para sujeitar-se inteiramente. Esse mesmo sentimento deve ocupar também a mente e o coração dos discípulos de Cristo hoje.
A obediência de Jesus não se sujeitou a estruturas humanas, políticas ou religiosas, mas estritamente ao Pai. Sempre que havia conflitos entre a vontade do Pai e das estruturas, sua opção era ouvir a vontade de Deus. Por esse motivo, Ele desafiou as autoridades políticas e religiosas com suas hipocrisias e preceitos mortos para estabelecer um novo jeito de adorar ao Pai em espírito e em verdade (Jo 4.23-24), confrontando as estruturas pesadas e impossíveis de serem obedecidas.
Nossa obediência deve seguir essa mesma lógica de Jesus quanto à obediência primeiramente a Deus Pai. Entretanto, é preciso tomar cuidado e deixar-se discernir pelo Espírito Santo para não confundir a vontade do Pai com rebeldias e teimosias próprias de nossos corações, contra as estruturas com as quais compartilhamos a vida. A obediência ao Pai poderá até confrontar as estruturas; porém, jamais o fará com rebeldias, amarguras, rancores ou qualquer maldade humana. Ainda que sob ameaças de morte e riscos, a obediência ao Pai sempre trará vida, como a de Cristo.
Ter a mente de Cristo em obediência ao Pai significa também estar ciente das responsabilidades como cidadão nesta terra, bem como cumprir com todas as responsabilidades que cabem, para que possamos refletir a imagem do Cristo. Ao mesmo tempo, saber que, a partir do momento que se entrega a vida para Deus, a conduta de vida precisa ser mais espiritual do que natural, conforme anteriormente descrito. Ter a mente de Cristo significa estar menos focado em coisas e projetos naturais e mais naquilo que é do Reino de Deus. Significa compreender que não nascemos para ser o melhor profissional da área, ou para ganhar muito dinheiro, ou para galgar posições sociais e políticas. Tudo isso, no entanto, pode até acontecer como consequência do que realmente significa a vontade do Pai.
Nascemos para representar Cristo nessa terra, para transmitir, através da mensagem do evangelho, que existe um Deus além dessa vida que vale a pena aceitar e seguir e que não há como representá-lo se o que prevalece ainda é a carnalidade, os maus desejos e os sonhos e projetos egoístas. Ter a mente de Cristo significa deixar que todas essas coisas, se for necessário, morram, para que os projetos e sonhos dEle sejam instaurados como prioridade.

Extraído do livro: A obra da Salvação.
Por: Claiton  Ivan Pommerening.

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