O que é uma Parábola?

Dificilmente tudo o que se fala a respeito das parábolas -para tratar da sua definição ou da explicação das suas características - é verdade para todos os casos. Por esse motivo, cada parábola precisa ser abordada de maneira exclusiva e não se deve pressupor que o seu desenvolvimento ocorre de acordo com o das demais. Uma parábola é, normalmente, definida como uma ilustração em função da ''falácia de raiz'' de se derivar o sentido de paraballo, que significa, literalmente, ''atirar ao lado''. A partir disso, as pessoas passaram a encarar as parábolas como histórias terrenas que expressam significados celestiais. Apesar de haver uma boa dose de verdade nisso, essa abordagem ao entendimento das parábolas do Novo Testamento mostrar-se-á inconsistente. As parábolas são muito mais do que ilustrações, e embora algumas tratem da escatologia futura, não estão falando do céu. Elas são dirigidas à vida neste mundo.
Na verdade, possivelmente nenhuma definição de parábola se      mostrará  completamente eficaz, pois toda definição que seja ampla o suficiente para englobar todas as formas acaba se revelando tão imprecisa a ponto de se mostrar praticamente inútil. Algumas definições bem conhecidas merecem uma menção da nossa parte. T. W Manson sugeriu que: ''A parábola é una criação literária na forma de narrativa desenvolvida para retratar uma espécie de caráter por advertência ou exemplo, ou para encarnar um princípio do governo de Deus para com este mundo e com os homens (sic}''. As parábolas nos falam de Deus e da humanidade, mas nem todas são narrativas. C.H. Dodd declarou que as parábolas ''são a expressão natural de uma mente que visualiza a verdade em figuras concretas em vez de concebê-la por meio de abstrações'' ,e esta sua definição é frequentemente repetida: ''No nível mais básico, a parábola é uma metáfora ou imagem tirada da natureza ou da vida comum que prende o ouvinte pelo seu caráter vivo ou esquisito, que deixa a mente com um nível suficiente de dúvida acerca da sua aplicação precisa a ponto de lhe lançar pensamentos ativos''. Tecnicamente falando, uma parábola é muito mais do que uma metáfora ou uma imagem, e apesar dessa definição ser útil para muitos casos, para outros ela não será adequada. Algumas parábolas não são nem vivas, nem esquisitas (por exemplo, Me 13.28), e algumas não deixam qualquer sombra de dúvida acerca da sua aplicação. Paul Ricoeur descreveu as parábolas como ''a conjunção de uma forma narrativa com um processo metafórico''. Esta também é urna definição útil, mas algumas parábolas, especialmente se considerarmos a forma como o Novo Testamento utiliza a palavra parabole, não são narrativas; além disso, algumas nem são metáforas ou, pelo menos, o seu caráter metafórico é questionado. Mais adequada é a definição que Theon dá ao que é uma fábula (mythos) - o gênero ao qual as parábolas pertencem - como sendo ''um dito fictício que ilustra a verdade'', ou o melhor de todos, se adotarmos as palavras de um poeta moderno: ''As parábolas são jardins imaginários que contêm sapos de verdade''. Elas criam um mundo imaginário que reflete a realidade. Sobre as fábulas diz-se que são manobras táticas para despertar novos pensamentos que o autor passa a manipular. Este também é o caso das parábolas. Totalmente alinhada com isso está a definição de mashal (a palavra hebraica correspondente ao vocábulo parabole no grego) como sendo ''uma narrativa alusiva que é feita por um objetivo ulterior''. As parábolas são uma forma de comunicação indireta que tem por intenção ''enganar o ouvinte no sentido da verdade''. Os rabinos judeus falavam das parábolas como sendo instrumentos para a compreensão da Torá; antes das parábolas ninguém conseguia compreender a Lei, mas quando Salomão e outros criaram as parábolas, o povo passou a compreendê-la. De forma análoga, podemos dizer que as parábolas de Jesus são instrumentos de compreensão do seu ensino acerca do Reino.
O tratamento dispensado por Soren Kierkegaard à comunicação indireta merece uma cuidadosa reflexão. Ele nos ajuda a entender que a comunicação direta é importante para a propagação da informação, mas que o aprendizado é mais do que a informação, especialmente quando as pessoas pensam que já entendem do assunto. As pessoas levantam as suas defesas contra a comunicação direta e aprendem a conformar a sua mensagem aos canais da sua compreensão da realidade. A comunicação indireta ocorre pela janela dos fundos e confronta aquilo que entendemos por realidade. As parábolas são uma forma de comunicação indireta.
Se o significado é o valor atribuído a um conjunto de relações, as parábolas proporcionam novos conjuntos de relações que nos capacitam (ou nos forçam) a ver as coisas de uma maneira inteiramente nova. As parábolas funcionam como lentes que fazem com que enxerguemos a verdade e corrijamos a distorção da nossa visão. Elas permitem que vejamos aquilo que, de outra forma, não veríamos, e pressupõem que devamos olhar e ver uma realidade específica. Elas não são exames de Rorschach*, mas histórias com um objetivo, analogias por meio das quais somos capacitados a enxergar a verdade. Com exceção de cinco parábolas contadas por Jesus... elas são histórias com dois níveis de significado, o nível da história por meio do qual vemos as coisas e o nível da verdade, ou seja, a realidade que está sendo retratada.

         O  objetivo imediato de uma parábola é ser algo bastante atraente e, ao ser atraente, ela redireciona a atenção e desarma o ouvinte. O objetivo final de  uma  parábola é despertar uma compreensão mais aprofundada, estimular a consciência  e levar os ouvintes a uma  ação.  A  razão principal  por  que  as parábolas  de Jesus são histórias  com  propósito  é, como veremos,  o fato de elas servirem como instrumentos proféticos, uma ferramenta de uso especial das pessoas que  são portadoras de uma  mensagem divina. Elas não ocorrem em porções da Bíblia concentradas  na Torá, em narrativas históricas  ou  nos escritos da Igreja Primitiva.  Elas são utilizadas por pessoas que  procuram fazer  com  que o  povo de Deus  pare,  reconsidere  os seus  caminhos  e  modifique o seu comportamento. As parábolas  bíblicas  revelam  o caráter e a maneira como o nosso Deus age; mostram também o que é a humanidade e o que ela deve -    e pode -    se tornar. As parábolas não são meramente historietas informativas.  Da mesma forma que os profetas que o antecederam, Jesus falava por meio de parábolas para despertar o raciocínio e estimular unia reação das pessoas  em  relação  a Deus.  As parábolas  normalmente  atraem os ouvintes, provocam  reflexão e geram  ação.  Elas constituem  argumentos decisivos que  são lançados diante de um público normalmente recalcitrante e de  raciocínio lento.   Elas  buscam  incitar as pessoas a atitudes  dignas do evangelho  e  exigidas  no  Reino  de  Deus.  Um  dos  maiores  problemas  das igrejas cristãs, particularmente do cristianismo ocidental, é a nossa passividade absurda. As parábolas nos instigam -    literalmente, por causa de Jesus -a fazer algo! As parábolas não procuram uma ''moralidade branda'' sobre a qual Kierkegaard reclamava, mas uma resposta radical de pessoas que tomam para a si a sua cruz e passam a ser imitadoras de Deus: uma mudança a tal ponto de receber, merecidamente, o nome de ''conversão''.
         Na maioria dos casos, portanto, a parábola é uma analogia ampliada utilizada para ..convencer  e persuadir. Como veremos, é desta forma que os gregos da antiguidade também utilizavam esse termo e ele se mostra abrangente  o  bastante  a  ponto  de  englobar  a  maioria  dos  usos  que  os evangelistas  fizeram  dele.  A lógica das  parábolas  de Jesus  é a analogia proporcional. 4° Correspondentes aos termos alemães Sache e Bild, as palavras teor e veículo são utilizadas na língua portuguesa para explicar o funcionamento da analogia. O teor se refere ao tema que está sendo comparado, o item do qual se busca formar uma ideia, e o veículo se refere à imagem que o ilustra, a parábola, o instrumento pelo qual a compreensão é transmitida. Uma analogia, de forma explícita ou implícita, vale­ se de um ou mais pontos de semelhança. Por exemplo, um discípulo é para Deus (teor) o mesmo que um escravo é para um senhor (veículo) no que diz respeito às suas obrigações irrevogáveis (ponto de semelhança). De acordo com John Sider, todas as parábolas que assim são chamadas nos Evangelhos envolvem mais de um ponto de semelhança - exatamente o contrário do que defendia Jülicher. A analogia, pela sua própria natureza, pode facilmente se tornar ''alegórica''.


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Aprovado pelo Conselho de Doutrina.
Título do original em inglês: Stories with Intent
William B. Eerdmans Publishing Company, Grand Rapids, Michigan, EUA
Primeira edição em inglês: 2008
Tradução: Marcelo S. Gonçalves
Preparação dos originais: Daniele Pereira, Gleyce Duque e Elaine Arsenio
Revisão: Gleyce Duque, Elaine Arsenio e Zenira Curty
Capa: Josias Finamore

Adaptação de projeto gráfico: Fagner Machado                                                     
CDD: 225 - Novo Testamento ISBN: 978-85-263-1065-0
As citações bíblicas foram extraídas da versão Almeida Revista e Corrigida, edição de 1995, da Socie­dade Bíblica do Brasil, salvo indicação em contrário.
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1ª edição: 2010 



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