Subsídio Lição 4 - 2º trimestre 2016 / A Graça e o Problema da Culpa






























Assuntos relacionados.
ü  Um Olhar em duas Direções
ü  Temos Paz!
ü  A Porta da Graça!
ü  Ninguém nunca Fez isso!
ü  A Culpa não Foi só de Adão
ü  Evitando os Extremos

ü  O segundo Adão

Romanos 5.1-4
Sendo, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus por nosso Senhor Jesus Cristo; pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes; e nos gloriamos na esperança da glória de Deus. E não somente isto, mas também nos gloriamos nas tribulações, sabendo que a tribulação produz a paciência; e a paciência, a experiência; e a experiência, a esperança.

Um Olhar em duas Direções
“Sendo, pois, justificados pela fé... ” (5.1a). Há um consenso entre os comentaristas que a seção que começa no capítulo cinco de Romanos é uma transição entre Romanos 1.18—4.25 e Romanos 5.1—8.39. Ela é, portanto, o elo que liga o que vem antes e o que vem depois. Retrospectivamente, Romanos 5.1 mostra o fato do que seja a justificação em Cristo Jesus. Por outro lado, olhando prospectivamente, Romanos 5.1 também enxerga aquilo que vem como resultado dessa justificação. É um olhar para a frente. Stanley Clark destaca que “a diferença de opinião a respeito de se associar o capítulo 5 com os capítulos anteriores (3.21—4.25) ou depois (6.1—8.39) sugere que seu papel é transitório; isto é, especialmente verdadeiro para os primeiros 11 versos. Em alguns aspectos, Romanos 5 olha para trás, para a gloriosa verdade da justificação do homem pela fé. No entanto, os conceitos vertidos têm mais em comum com 6.1—8.39 com 3.21—4.25. O tema da seção inteira (5.1—8.39) que é ‘justificou a nova vida do homem’”.


Temos Paz!
“.. temos pa% com Deus por nosso Senhor Jesus Cristo ” (5.1b). O efeito imediato da justificação é a paz com Deus. Os manuscritos gregos pertencentes ao texto crítico do Novo Testamento trazem a palavra “tenhamos” em lugar de “temos”. Todavia, os eruditos em Novo Testamento observam que a evidência interna do contexto dessa passagem exige o sentido presente do verbo. Nesse caso, a tradução “temos” é preferível.2
A paz com Deus é, portanto, uma realidade presente na vida do crente. Ela é a coroação ou resultado imediato da justificação. Não é algo que vamos ter somente no futuro, mas é algo que o crente já desfruta agora. Toda a argumentação de Paulo aponta na direção do aqui e agora na vida do crente. Andrew Murray, antigo expositor bíblico, comenta: “A paz com Deus é uma bênção coordenada à justificação, que se realiza sob circunstâncias de condenação e de sujeição à ira de Deus; e a justificação contempla nossa aceitação diante de Deus, como justos. E o pano de fundo é a nossa alienação diante de Deus; a paz com Deus contempla nossa restauração ao favor e à luz do rosto divino. O fato de que a paz com Deus recebeu a preeminência dentre as bênçãos provenientes da justificação é coerente com o status que a justificação nos assegura. ‘Paz com Deus’ denota relacionamento com Deus. Não se trata apenas de serenidade e tranquilidade de nossas mentes e corações; mas refere-se ao estado de paz que flui da reconciliação (w. 10,11) e reflete-se, primeiramente, sobre nossa alienação de Deus e nossa restauração ao favor divino. A paz da mente e do coração procedem da ‘paz com Deus’, sendo o reflexo em nossa consciência do relacionamento estabelecido pela justificação”.3


A Porta da Graça!
‘pelo qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes; e nos gloriamos na esperança da glória de Deus” (5.2). A graça de Deus é o coração da Carta aos Romanos. Tudo gira em torno dela. O expositor bíblico William Barclay, perito em grego neotestamentário, captou muito bem o sentido desse texto no original. Aqui o quadro pintado por Paulo mostra a grande porta que a justificação pela fé nos abriu. Quando essa porta se abre e entramos por ela, encontramo-nos com a graça. Não com o julgamento, recriminação ou condenação, mas com a gloriosa graça de Deus.4 Nos últimos anos tem havido um verdadeiro despertar da graça. Mas é preciso olhar com cuidado para esse despertamento. Nem tudo que se passa por graça tem realmente graça. Na verdade, há uma graça sendo pregada e ensinada por aí que não tem graça alguma! A graça que justifica o pecado em vez do pecador, observou Dietrich Bonhoeffer, é uma graça barata.5 A graça de Deus é justificadora e perdoadora, mas também é responsabilizadora.
"... e nos gloriamos na esperança da glória de Deus” (5.2). Os comentaristas Sanday e Headlam destacam que “é a glória da presença divina (Shekinah) que é comunicada aos homens (parcialmente aqui, mas) em plena medida, quando ele entrar por completo na sua presença; então o homem por inteiro será transfigurado por Ele”.6 O apóstolo via aqui, como destacou o expositor bíblico Frédéric L. Godet, o elevado sentimento de segurança pela alegria antecipada do nosso triunfo.7 Essa esperança, portanto, tem uma dimensão escatológica. Os crentes se regozijam pela esperança de um futuro que, embora ainda não desfrutado em toda a sua plenitude aqui, mas que já está construído por Deus.
"... nos gloriamos nas tribulações” (5.3). A imagem que temos quando lemos essas palavras de Paulo nos dá a impressão de que ele parece subir degraus com seu argumento. Primeiramente ele fala da graça como uma grande porta aberta que nos conduz até a presença da majestade divina.8 A nossa caminhada até lá é um andar movido pela esperança. Mas nesse caminho existem pedras! Enfrentamos lutas, angústias, tribulações. Mas não é motivo para desânimo, pois isso é parte natural desse caminhar. O sofrimento ou tribulações são usados por Deus para moldar nossa vida. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento destaca que o termo tblipsesin, traduzido aqui como “tribulação”, quer dizer pressão? Nada disso serve de motivo para o desânimo, nem mesmo as pressões, porque elas conduzem à perseverança.
"... a tribulação produza paciência” (5.3). A tribulação produz a paciência. “Nunca poderíamos desenvolver ‘paciência’ se nossas vidas estivessem isentas de problemas”, destaca William Mcdonald.10
“... e a paciência, a experiência; e a experiência, a esperança” (5.4). Paulo chega agora ao estágio em que o cristão, provado pela fornalha da vida, cresceu em maturidade. Agora ele tem experiência nessa caminhada. Essa experiência lhe dá a certeza de que a sua jornada é alicerçada na esperança da vida do Reino. Não é uma esperança que olha o vazio, mas uma esperança escatológica, eterna, que se plenifica em Deus.


Romanos 5.5-11
E a esperança não traz confusão, porquanto o amor de Deus está derramado em nosso coração pelo Espírito Santo que nos foi dado. Porque Cristo, estando nós ainda fracos, morreu a seu tempo pelos ímpios. Porque apenas alguém morrerá por um justo; pois poderá ser que pelo bom alguém ouse morrer. Mas Deus prova o seu amor para conosco em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores. Logo, muito mais agora, sendo justificados pelo seu sangue, seremos por ele salvos da ira. Porque, se nós, sendo inimigos, fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho, muito mais, estando já reconciliados, seremos salvos pela sua vida. E não somente isto, mas também nos gloriamos em Deus por nosso Senhor Jesus Cristo, pelo qual agora alcançamos a reconciliação.


Ninguém nunca Fez isso!
A nossa esperança, observa o apóstolo Paulo, não pode ser confundida porque se fundamenta na certeza. A certeza que vem com o amor de Deus que é derramado em nosso coração pelo Espírito Santo. Passamos então a experimentar o grande amor de Deus que o levou justificar ímpios pecadores. O teólogo suíço Karl Barth assim se expressou sobre essa passagem: “Gloriamo-nos, pois, na esperança, porque ela não está fundamentada em ação de nosso espírito de criaturas, mas no Espírito Santo que nos foi outorgado, mediante o derramamento do amor de Deus em nossos corações. O Espírito Santo é a obra de Deus, na fé; é o poder criador e redentor do Reino de Deus que está próximo e que, pela fé, tange o mundo dos homens e o faz ressoar como o cristal às vibrações do diapasão. O Espírito Santo é o eterno ‘Sim’ da fé que, vista do lado humano, apenas pode ser descrita como negação e vácuo; ele é o milagre inicial e criativo desta fé. O Espírito Santo é igual a Deus e por ele Deus tributa justiça ao que crer”.11
“Mas Deus prova o seu amorpara conosco em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores” (5.8). Martinho Lutero (1483-1546), reformador alemão, colocou em destaque o amor de Deus pelos pecadores quando resumiu o capítulo 5 em seu prefácio da Carta aos Romanos. “No quinto capítulo, ele fala dos frutos e das obras da fé, quais sejam: paz, alegria, amor a Deus e a todos, além de segurança, confiança, ânimo e esperança em tristeza e sofrimento. Pois, onde a fé for verdadeira, tudo isso resulta do bem superabundante que Deus nos demonstra em Cristo: de tê-lo feito morrer por nós antes mesmo de lho podermos pedir quando ainda éramos inimigos. Temos, portanto, que a fé justifica sem quaisquer obras e, mesmo assim, não sucede daí que não se deveria fazer boa obra, e sim, que as obras justas não ficam ausentes; destas, porém, os santos por nada saberem [19] inventam para si mesmos obras próprias, que não contêm nem paz, nem alegria, nem segurança, nem amor, nem esperança, nem porfia, tampouco qualquer tipo de obra e fé cristã direta”.12
Romanos 5.12-21
Pelo que, como por um homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, por isso que todos pecaram. Porque até à lei estava o pecado no mundo, mas o pecado não é imputado não havendo lei. No entanto, a morte reinou desde Adão até Moisés, até sobre aqueles que não pecaram à semelhança da transgressão de Adão, o qual é a figura daquele que havia de vir. Mas não é assim o dom gratuito como a ofensa; porque, se, pela ofensa de um, morreram muitos, muito mais a graça de Deus e o dom pela graça, que é de um só homem, Jesus Cristo, abundou sobre muitos. E não foi assim o dom como a ofensa, por um só que pecou; porque o juízo veio de uma só ofensa, na verdade, para condenação, mas o dom gratuito veio de muitas ofensas para justificação. Porque, se, pela ofensa de um só, a morte reinou por esse, muito mais os que recebem a abundância da graça e do dom da justiça reinarão em vida por um só, Jesus Cristo. Pois assim como por uma só ofensa veio o juízo sobre todos os homens para condenação, assim também por um só ato de justiça veio a graça sobre todos os homens para justificação de vida. Porque, como, pela desobediência de um só homem, muitos foram feitos pecadores, assim, pela obediência de um, muitos serão feitos justos. Veio, porém, a lei para que a ofensa abundasse; mas, onde o pecado abundou, superabundou a graça; para que, assim como o pecado reinou na morte, também a graça reinasse pela justiça para a vida eterna, por Jesus Cristo, nosso Senhor.


A Culpa não Foi só de Adão
“Pelo que, como por um homem entrou 0 pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim tamhém a morte passou a todos os homens, por isso que todos pecaram” (5.12). Estamos diante de um dos textos que centrais na doutrina da justificação pela fé. Todavia, um dos mais controvertidos dessa carta. Como outras passagens de Romanos, essa Escritura está sujeita a calorosos debates. Há pelo menos uma meia dúzia de interpretações sobre essa porção da Escritura; todavia, o debate em torno desse texto não é novo. Em parte, esse debate tem sido motivado pela disputa em torno da expressão grega eph’hoipantes hemarton, que aparece no final do versículo 12 do capítulo 5 de Romanos.
Como é de se esperar, as versões bíblicas não são unânimes na tradução dessa passagem. Porém, as controvérsias começaram quando Agostinho (354-430 d.C.), bispo de Hipona, que não era versado em grego bíblico, seguiu a versão latina “in quo”, traduzindo erradamente a preposição grega epb’hoi (porque) com o sentido de “em quem”.u A sentença grega “porquanto todos pecaram”, ou “porque todos pecaram”, no texto de Agostinho ganhou o sentido apenas de “em quem todos pecaram”.15 Isso significa que todos os homens estão ligados seminalmente ao seu antepassado Adão.16 Essa crença do bispo de Hipona conduziu-o a acreditar que “os homens estavam maculados pelo pecado original, que lhes foi transmitido de geração em geração, e que por isso não mereciam ser salvos”.17 Esse fato, segundo Agostinho, levou Deus a arbitrar a salvação para alguns e a condenação para outros.18
Na teologia do bispo de Hipona, a faculdade humana do livre-arbítrio também foi afetada. Ele não negou que o homem possuísse livre-arbítrio depois da Queda. Pelo contrário, até mesmo achou que se tratava de um bem necessário. Todavia, por causa do pecado original, ele acreditava que o homem ficou incapacitado de escolher aquilo que é bom. Nesse aspecto, o mal moral devia-se ao livre-arbítrio humano. Agostinho confirma sua concepção radical do cativeiro do livre-arbítrio quando escreve: “Quando o homem pecou por seu próprio livre-arbítrio, nesse caso, tendo o pecado sido vitorioso sobre ele, a liberdade da sua vontade foi perdida”.19 Em outra obra, o Livre-Arbítrio, Agostinho, escreveu: “Mas quanto a esse mesmo livre-arbítrio, o qual estamos convencidos de ter o poder de nos levar a pecar, pergunto-me se aquele que nos criou fez bem de no-lo ter dado. Na verdade, parece-me que não pecaríamos se estivéssemos privados dele”.20
A argumentação de Agostinho, como foi demonstrado, ficou comprometida quando se sabe que a exegese feita por ele partiu de uma tradução equivocada do texto de Romanos.21 O expositor Giuseppe Barbaglio comenta que “a versão da Vulgata — ‘no qual (Adão) todos pecaram’ — na qual, por exemplo, S. Agostinho se apoiou, aduzindo uma prova fácil demais da doutrina do pecado original, deve ser excluída, porque é errada”.22 Por sua vez, o teólogo Millard J. Erickson destaca que Agostinho entendia que “a oração final, no versículo 12, no sentido de que nós estávamos realmente “em Adão” e, portanto, o pecado de Adão também era nosso. Mas como sua interpretação baseou-se numa tradução inadequada, precisamos analisar melhor a oração gramatical. Devemos perguntar o que significa “todos os homens pecaram”.23 Não significa, evidentemente, a condenação de uns para o céu e outros para o inferno, nem tampouco a supressão do livre-arbítrio humano. Erickson destaca, por exemplo, que o Senhor Jesus não considerou como condenados aqueles que ainda não tinham atingido a idade da capacidade moral. “Há vários indicadores nas Escrituras de que as pessoas não são moralmente responsáveis antes de certo ponto, o que às vezes chamamos de ‘idade da responsabilidade’ (Mt 18.3; 19.14; 2 Sm 12.23; Is 7.15; Jn 4.11)”.24 E conclui que fica “o fato evidente de que, antes de determinado momento na vida, não existe responsabilidade moral, pois não há consciência do certo e do errado”.25 Agostinho, portanto, criou um conceito de depravação no pecado que vai muito além daquele que é mostrado na Escritura. Uma exegese mais fiel ao texto confirma a corrupção do pecado e a consequente natureza pecaminosa humana; todavia, não da forma extremada como ensinou Agostinho.26
Uma compreensão adequada do texto de Romanos 5.12 nos conduz a juntar unidade-universalidade. Giuseppe Barbaglio comenta com muita precisão que “não se trata, porém, de um esquema mecânico: a solidariedade que está na base não tem mão única; não envolve, fatal e necessariamente, todos os homens na esfera de ação de um só. Paulo, de fato, se dissocia da concepção típica do mito gnóstico, que via a humanidade como uma massa de vítimas inconscientes de um trágico evento originário. Ele introduz no esquema um decisivo elemento de liberdade e de responsabilidade, afirmando que o influxo de um sobre todos é condicionado pela adesão destes. Portanto, o destino humano é requerido, escolhido. No versículo 12, de fato, à causalidade de Adão ele acrescenta a decisão negadva de todos os homens: ‘por causa de um só homem o pecado entrou no mundo... porque todos pecaram. A humanidade se fez solidaria com seu cabeça ao pecar. O apóstolo não está muito distante de um significativo texto judaico, que chega a dizer: ‘Se o primeiro Adão, pecou e trouxe a morte para todos os que ainda não existiam, todos os que dele nasceram, todavia, prepararam para a própria alma os suplícios futuros; cada um escolheu as glórias futuras... Porque Adão não foi a causa única, sozinho; em relação a nós todos, cada um é, para si mesmo, Adão. Mas, diferentemente da teologia judaica, ele acentua um fator subjetivo, atribuindo à lei divina um papel ativo na proliferação dos pecados’ (cf. v. 20)”.
A ideia de uma culpa apenas compulsória, que não leva em conta as liberdades humanas, como cria Agostinho, deve ser rejeitada. O expositor Adolf Pohl confirma esse entendimento quando diz: “A amplitude do poder do pecado e da morte soma-se sua profundidade. Nossa escravização também é nutrida pelo próprio pecado cometido em atos: porque todos pecaram (Rrn 2.12; 3.23). Em última análise, a miséria da humanidade consiste em sua culpa. Sem este adendo de fundamentação, nossas condições de vida seriam entendidas como uma fatalidade compulsória. Porém, trata- se de história pessoal, na qual as condições jamais servem de desculpa para o próprio fracasso (Rm 1.21). Também fora do Paraíso continua em vigor que: ‘a ti cumpre dominá-lo (o pecado)!’ (Gn 4.7). Ainda que não tenhamos de nos responsabilizar pelo fato de estarmos no mundo, temos de fazê-lo em relação aos nossos pecados de fato”.28
Em uma bela e longa exposição sobre o pecado, a culpa e a liberdade de escolha, o expositor Millard J. Erickson, conclui: “Em Romanos 5, o paralelismo que Paulo traça entre Adão e Cristo em termos do relacionamento deles conosco é impressionante. Uma declaração semelhante é vista em 1 Coríntios 15.22: ‘Pois, assim como em Adão todos morrem, do mesmo modo em Cristo todos serão vivificados’. Ele afirma que, de forma paralela, o que os dois fizeram tem influência sobre nós (assim como o pecado de Adão leva à morte, o ato de justiça de Cristo conduz à vida). Que paralelo é esse? Se a condenação e a culpa de Adão nos são atribuídas sem que tenhamos alguma escolha consciente do ato que ele praticou, a mesma lógica será necessariamente válida para a atribuição da justiça de Cristo e de sua obra de redenção. Mas será que sua morte nos justifica simplesmente por causa de sua identificação com a humanidade por meio da encarnação, sem depender da aceitação pessoal e consciente de sua obra? E será que a graça de Cristo é atribuída a todos os seres humanos assim com o pecado de Adão é igualmente atribuído a todos? A resposta mais comum dos evangélicos é negativa; há muitos indícios da existência de duas categorias de pessoas: as perdidas e as salvas, e de que somente a decisão de aceitar a obra de Cristo pode torná-la eficaz em nossa vida [...] todos nós participamos do pecado de Adão e, portanto, recebemos tanto a sua natureza corrupta após a Queda quanto a culpa e a condenação vinculadas a seu pecado. No entanto, na questão da culpa, assim como na atribuição da justiça de Cristo, é preciso haver uma decisão voluntária
e consciente de nossa parte. Enquanto isso não ocorre, existe apenas uma atribuição condicional de culpa. Portanto, não há condenação antes da idade da responsabilidade”.29


Evitando os Extremos
Quando se afirma que o homem é moralmente responsável por suas escolhas, tendo livre-arbítrio, não devemos incorrer no erro pelagiano.30 Pelágio deu ênfase exagerada à responsabilidade moral e seus resultados, tornando a santidade um mero subproduto do esforço humano. Parte desse entendimento pelagiano originou-se da sua revolta quando leu as Confissões de Agostinho e as achou fatalista e derrotista. Agostinho estava em um extremo e Pelágio foi para o extremo oposto. O erro de Pelágio, como bem observou David Pawson, foi desenvolver uma perspectiva demasiadamente elevada da força de vontade humana. Dessa forma, todos podem tomar a decisão de fazer o bem e ser justos, independentemente do concurso da graça. Ao assumir essa posição, Pelágio negou a doutrina do pecado original (herdado) de Agostinho. Não havia, portanto, nenhuma corrupção herdada nem nenhuma inclinação para o mal. Cria que as pessoas eram inerentemente boas. Como ele negou a queda, não havia, portanto, necessidade de expiação ou regeneração.31
Lembro-me de uma história que li há algum tempo, que serve para ilustrar o que está exposto em Romanos 5.12 e que está sendo afirmado aqui. Conta-se que um velho lenhador trabalhava em uma fazenda. Seu trabalho era rachar toras de madeira para uso da fazenda. Certo dia, enquanto passeava pela fazenda, o proprietário escutou o velho lenhador se lastimar da sorte. Ele dizia: “Adão, Adão, você me paga”. Vendo as lamúrias do velho lenhador, o fazendeiro se aproximou e perguntou a razão que o estava levando a se lamentar. Ele então disse ao patrão que Adão era o responsável por aquela situação, pois, se não tivesse pecado, ele não estaria ali. Imediatamente o fazendeiro mandou-o abandonar o seu machado e se dirigir para a casa na fazenda.
Chegando ali, o fazendeiro disse: “A partir desse momento você não precisará mais rachar lenha. Você terá novas atribuições. Seu trabalho agora é ficar na varanda da casa fazendo o serviço de vigilância com o direito de beber limonada na hora que quiser!” O velho lenhador foi às lágrimas. Quando ainda se refazia de suas emoções, o fazendeiro concluiu: “Mas o senhor não pode abrir aquela caixa fechada que está em cima do peitoril da casa”. O velho lenhador balançou a cabeça afirmativamente. Pensando com seus botões, ele achou suas novas atribuições um presente de Deus.
Os dias passaram e o velho lenhador se regozijava de sua nova situação. Não estava mais trabalhando de sol a sol, mas na sombra da casa da fazenda. Passaram-se duas semanas e ele continuava firme em seu propósito de obedecer ao seu patrão e não tocar na caixa secreta que estava no peitoril da casa. Na terceira semana, veio-lhe a curiosidade de saber o que estava dentro daquela caixa. Por que ele não poderia tocá-la? Resolveu então tocar levemente na caixa. Foi o suficiente para observar por uma abertura que havia algo dentro da caixa — um pequeno pedaço de papel. Todos os seus instintos vibraram! O que poderia estar escrito nele? Passou, então a racionalizar: Por que ele não poderia abrir a caixa e ler o papel? O que havia de mal nisso ? Ponderou.
Na quarta semana, o velho lenhador não resistiu à tentação e abriu a caixa! Quando retirou o pequeno papel, o seu conteúdo dizia: “Velho lenhador, a culpa não foi só de Adão. Volte já para o campo para rachar lenha”.32
Sim, a culpa não foi só de Adão. Romanos 5.12 tem um sentido solidário, em que todos nós participamos da culpa de Adão, porque todos nós estávamos no lombo de Adão. Todos nós também somos responsáveis individualmente por nossos pecados e pelas escolhas que fazemos. O expositor bíblico Joseph A. Fitzmyer sublinha esse fato quando afirma: “No versículo 12, Paulo atribui a morte a duas causas, relacionadas entre si: a Adão e a todos os pecadores humanos”.33 Comentando Romanos 5.12, o expositor J. D. G. Dunn escreveu: “O que Paulo parece querer dizer é o seguinte: 1) Toda humanidade compartilha uma servidão comum ao pecado e à morte. Não se trata apenas da carnalidade natural, uma mortalidade criada. O pecado está ligado com isso, uma não correspondência ao melhor intencionado por Deus. A morte é o resultado de uma ruptura na criação. 2) Há dois lados nesse estado de coisas, envolvendo tanto o pecado como um dado do tecido social da sociedade e o pecado como uma ação imputável de responsabilidade individual”.34
Alguns intérpretes insistem na sua fidelidade à interpretação agostiniana, não aceitando o fato de que o homem é um ser moralmente livre e que pode sim decidir-se pelo bem ou pelo mal. A meu ver, há muita tinta gasta, sem sucesso, na tentativa de provar, a partir de Romanos 5.12 (somados com outros textos bíblicos), que a crença na solidariedade da raça na queda de Adão jogou o homem numa total depravação pecaminosa a ponto de excluir a sua capacidade da livre-escolha. Para esses intérpretes, o homem “morto no pecado” não possui nenhum tipo de sensibilidade espiritual. A afirmação de Robert D. Culver, por exemplo, no sentido de que “as Escrituras ensinam a ausência completa de vida espiritual nos homens decaídos”, apenas perpetua o erro agostiniano.35 A tentativa de usar Efésios 2.1 como texto prova, com o argumento de que esse homem está morto e não pode escolher nada, reflete mais uma crença na tradição teológica agostiniana do que o entendimento bíblico desse texto. Esse entendimento equivocado tem feito com que wesleyanos e arminianos sejam acusados por Culver de tenderem a “minimizar a incapacidade total dos irregenerados nas questões espirituais, relacionadas a Deus, para tanto minimizando a força da linguagem bíblica sobre ela, dizendo por exemplo que ‘mortos em [...] transgressões e pecados [Ef 2.1; cf. cl 2.13] é apenas uma figura de linguagem’. O homem, dizem eles, ‘ainda tem livre-arbítrio’. Mas Paulo não está usando uma figura”.36
O argumento de Culver é mais dogmático do que ortodoxo, e não reflete o pensamento bíblico. E impossível não enxergar um sentido metafórico na palavra “morto” quando observamos que Paulo usou desse tipo de recurso linguístico em outros textos de suas cartas. “Levanta-te de entre os mortos” (Ef 5.14); “vejam-se como mortos para o pecado” (Rm 6.11); “o qual dá vida aos mortos” (Rm 4.17); “sem lei está morto o pecado” (Rm 7.8); “nós morremos para o pecado” (Rm 6.2); “já morremos com Cristo” (Rm 6.8); “vós estais mortos para a lei” (Rm 7.4). Em todas essas passagens, o apóstolo atribuiu um sentido figurado a palavra “morto”; então por que somente em Efésios 2.1 ele lhe daria um sentido literal? Parece-me uma aporia difícil de ser superada. “Morto para o pecado”, portanto, carrega uma carga metafórica. Em palavras mais simples, a doutrina da natureza corrompida é bíblica, mas afirmar que ela deixou os homens totalmente impossibilitados de escolherem o bem ou o mal não é.
A depravação no pecado ensinada pelas Escrituras afirma sua dimensão corporativa, sem, contudo, negar sua dimensão moral e pessoal. Portanto, a afirmação de Culver de que o homem não regenerado é totalmente insensível para a realidade espiritual se ajusta mais ao pensamento de Agostinho do que ao pensamento de Paulo. Nesse aspecto é preciso destacar que a expressão “morto espiritual” deve ser entendida como “separado de Deus”, e não “insensível para as realidades espirituais”. O homem, mesmo separado de Deus, não deixou de possuir a capacidade de escolher o bem ou o mal. Pelo contrário, ele pode sim aceitar ou resistir a graça que lhe é oferecida. A graça, portanto, não é fatalista nem tampouco irresistível. Um dos princípios básicos da filosofia do direito é que onde não houver livre escolha não há também responsabilidade moral.

O segundo Adão
“Pois assim como por uma só ofensa veio o jut^o sobre todos os homens para condenação, assim também por um só ato dejustiça veio a graça sobre todos os homens para a justificação de vida” (5.18). O primeiro Adão colocou a raça nas sombras do pecado. O quadro realmente era desesperador. Um pecou, logo todos pecaram! Um desobedeceu, logos todos desobedeceram. Paulo não explica como isso aconteceu, mas onde aconteceu — na queda do primeiro homem. Passamos a carregar conosco a natureza adâmica, todavia sem deixarmos de ser responsáveis pelos nossos atos. A queda depravou a raça, mas não lhe tirou o livre-arbítrio. Não há responsabilidade moral sem livre escolha.
O apóstolo agora mostrará que por intermédio de um homem, Jesus Cristo, o segundo Adão, veio a graça sobre todos os homens! Adão derrubou o homem. Por outro lado, Jesus veio levantar esse homem caído: “Veio a graça sobre todos os homens” (5.18). E a vontade de Deus salvar a todos (1 Tm 2.4). Stanley Clark fez o seguinte paralelo entre o primeiro e o segundo Adão: o pecado entrou por Adão, a vida entrou por Cristo; a morte reinou desde Adão até Moisés, a vida reina mediante Jesus Cristo; a ofensa de um alcançou a todos, a justiça de um alcançou a todos; pela desobediência de um todos foram feitos pecadores, pela obediência de um muitos serão constituídos justos”.37
A Ele toda honra e toda glória. 



Fonte: Retirado do livro Maravilhosa Graça!
O evangelho de Jesus Cristo revelado na Carta aos Romanos
Por/ José Gonçalves

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Preparação dos originais: Daniele Pereira Capa e projeto gráfico: Wagner de Almeida Editoração: Anderson Lopes

CDD: 220 — Comentário Bíblico ISBN: 978-85-263-1317-0
As citações bíblicas foram extraídas da versão Almeida Revista e Corrigida, edição de 1995, da Sociedade Bíblica do Brasil, salvo indicação em contrário.
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Ia edição: 2016 Tiragem: 41.000



LIÇÃO 4 OS BENEFÍCIOS DA JUSTIFICAÇÃO






























OS BENEFÍCIOS DA JUSTIFICAÇÃO

Ora, pode uma doutrina como a da Justificação pela Fé ter um benefício prático na vida do crente? Há alguma consequência concreta quando o crente toma a consciência de que foi justificado por Deus por intermédio da graça divina mediante a fé em Jesus?

Professor, é importante enfatizar aos alunos de que toda doutrina bíblica possui uma aplicação para vida. Doutrina não é apenas teoria; a doutrina visa amadurecer o crente a fim de que ele caminhe de maneira segura no processo de amadurecimento da fé no caminho de Cristo. Por isso, ao iniciar a aula desta semana, conforme a sua possibilidade, reproduza resumidamente os benefícios da doutrina da Justificação pela Fé com o objetivo de facilitar a reflexão em sala de aula:

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Graça, um Favor Imerecido.
































Romanos 3.21-26
Mas, agora, se manifestou, sem a lei, a justiça de Deus, tendo o testemunho da Lei e dos Profetas, isto é, a justiça de Deus pela fé em Jesus Cristo para todos e sobre todos os que creem; porque não há diferença. Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente pela sua graça, pela redenção que há em Cristo Jesus, ao qual Deus propôs para propiciação pela fé no seu sangue, para demonstrar a sua justiça pela remissão dos pecados dantes cometidos, sob a paciência de Deus; para demonstração da sua justiça neste tempo presente, para que ele seja justo e justificador daquele que tem fé em Jesus.
Declarado Inocente!
"Mas, agora, se manifestou, sem a lei, a justiça de Deus, tendo o testemunho da Lei e dos Profetas” (3.21). Essa seção que começa em Romanos 3.21 e se estende até 4.25 apresenta o remédio do diagnóstico que Paulo tinha dado anteriormente para a questão do pecado em Romanos 1.18—3.20. Vimos que Paulo primeiramente apresentou o mundo pagão totalmente mergulhado nas trevas do pecado. Por outro lado, a situação dos seus compatriotas judeus não era diferente. Eles também estavam debaixo do domínio do mesmo pecado. É, pois, nessa seção que o apóstolo apresentará a solução de Deus para a rebelião do homem — a justiça de Deus imputada a todos por Cristo Jesus.
À parte da lei, isto é, sem o concurso da lei, a justiça de Deus se manifestou para resolver o dilema humano. Essa justiça divina, que se manifestaria em Cristo Jesus, já era testemunhada pela própria lei e pelos

profetas (v. 21). Primeiramente, a imagem que Paulo tem em mente aqui é de um tribunal. Alguém que se encontra como réu diante de um juiz e de quem espera o veredicto condenatório. Todavia, em vez de receber uma condenação, ele recebe a absolvição.
O expositor bíblico William Barclay mostra o pano de fundo da doutrina da justificação nessa passagem. Nesse exemplo de Paulo, imagina-se o homem diante do tribunal de Deus. Barclay destaca com muita propriedade que a palavra grega traduzida como “justificar” vem da mesma raiz de dikaiún e que todos os verbos gregos que terminam em ún têm o sentido de considerar alguém como algo e não 0 de fazer algo a alguém. Dessa forma, se alguém que é inocente se apresenta diante de um juiz, o juiz, evidentemente, o declarará inocente. Todavia, o caso mostrado por Paulo aqui é diferente. A pessoa que se apresenta diante de Deus é totalmente culpada, merecendo a punição do seu erro, porém, o justo Juiz, em uma demonstração de sua graça infinita, considera-o como se fosse inocente. Isso é o que se entende do significado da palavra “justificação” no contexto paulino. Quando Paulo diz “Deus justifica o ímpio”, significa, dentro do contexto da justificação, que Deus trata o ímpio como alguém bom. E evidente que tal raciocínio deixou os judeus totalmente escandalizados. Na mente dos judeus, apenas um juiz iníquo agiria dessa forma, pois justificar o ímpio é uma abominação para Deus (Pv 17.15); “não justificarei o ímpio” (Ex 23.7). Todavia, a argumentação de Paulo mostra que é exatamente isso o que Deus fez.
Na mente de Paulo, observa Barclay, se alguém desejasse saber como Deus é, então deveria olhar para Jesus, pois Ele revelou Deus aos homens. O verbo encarnado de Deus veio mostrar o grande amor de Deus pelos homens, mesmo estes estando mortos em seus delitos e pecados (Ef 2.1,2). Barclay destaca que “quando descobrimos isso e cremos, nossa relação com Deus muda radicalmente. Estamos conscientes do nosso pecado, mas não estamos aterrorizados ou distantes. Quebrantados e arrependidos, recorremos a Deus como uma criança triste se chega a sua mãe e sabemos que o Deus a quem chegamos é amor. Isso é o que significa justificação pela fé em Jesus Cristo. Isso significa que estamos em relacionamento correto com Deus porque acreditamos sinceramente que o que Jesus nos disse de Deus é a verdade. Já não somos estranhos que têm medo de um Deus irado. Somos filhos, crianças errantes que

confiam no amor do Pai que os perdoará. E não podíamos nunca chegar a esse relacionamento com Deus, se Jesus não tivesse vindo para viver e morrer para nos dizer como maravilhosamente Deus nos ama”.1
Escravo Alforriado
“...pela redenção que há em Cristo Jesus” (3.24b). A palavra traduzida como “redenção” vem do grego apolutrósis. De acordo com o léxico grego de Gerhard Kittel, essa palavra tem o sentido de resgate ou pagamento de um regaste, passando a ser um termo muito importante no Novo Testamento.2 A história seguinte ajuda-nos a entender o seu real sentido.
No tempo da escravidão, nos Estados Unidos, numa movimentada rua de certa cidade, uma multidão de pessoas concorreu para uma feira de escravos. Amarrados de pés e mãos, aguardavam compradores.
No meio dos escravos, estava uma moça de olhar cabisbaixo, triste, pensando na sua condição de escrava. Um cavalheiro passou, olhou para os escravos e teve profunda compaixão por aquela escrava, que era tratada como os demais escravos, feito animais. Na hora dos lances, o cavalheiro ofereceu o dobro. O leiloeiro bateu o martelo, estava livre, podia gozar de sua liberdade.
Soltaram a escrava e o seu libertador disse-lhe: “Acompanhe-me”. Com raiva, ela cuspiu na cara do seu benfeitor. Ele tirou o lenço do bolso, limpou a cusparada. Terminou a parte burocrática. Pegou os documentos e deu à jovem. Era a carta de alforria. A escrava estava livre. Com aqueles papéis ninguém conseguiria escravizá-la.
Com os documentos na mão, dizia quase sem parar: “O senhor me comprou para me libertar?”. Estava livre. Aquele homem comprou a libertação da jovem escrava. Poderia gozar de sua liberdade. A nossa escravidão, imposta pelo Diabo, é muito mais grave do que a escravidão daquela jovem negra. Estávamos nos-grilhões do Diabo. Comumente, ele nos levava pelo caminho do cigarro, das drogas, da prostituição, do furto e do crime. E esses pecados se refletiam em nossa família, nossos filhos, nosso trabalho. No cabresto do Diabo, ele nos levava por esses caminhos de sombras, de desilusão, de amargura, de morte. Matou a esperança em nosso coração. Como aquele cavalheiro nos Estados Unidos pagou a libertação da jovem, Cristo pagou o preço da nossa redenção.



O Preço de um Resgate
"... a qual Deus propôs para propiciação pela fé no seu sangue... ” (3.25). O vocábulo “propiciação” (gr. hilastérion), comenta Elvis Carballosa, significa sacrifico expiatório. Esse sacrifício expiatório foi a morte de Cristo em lugar do pecador. A frase “no seu sangue” se refere à morte de Cristo. A morte de Cristo foi uma realidade histórica.4
Romanos 3.27-31
Onde está, logo, a jactância? E excluída. Por qual lei? Das obras? Não! Mas pela lei da fé. Concluímos, pois, que o homem é justificado pela fé, sem as obras da lei. É, porventura, Deus somente dos judeus? E não o é também dos gentios? Também dos gentios, certamente. Se Deus é um só, que justifica, pela fé, a circuncisão e, por meio da fé, a incircuncisão, anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira nenhuma! Antes, estabelecemos a lei.
Jesus e o Judaísmo Palestino
“Concluímos, pois, que 0 homem é justificado pela fé, sem as obras da lei” (3.28). Nesse ponto, dentro de nosso comentário textual e exegético desse texto, é preciso fazer referência a um grande debate que nos últimos anos tem surgido em torno da teologia paulina da graça.5 Alguns expositores têm defendido a tese de que Paulo não estaria combatendo o legalismo judaico, isto é, a salvação pelas obras, mas em vez disso estaria se posicionando apenas contra o orgulho judaico de pertencer ao povo da aliança.
Os escritos do norte-americano E. P. Sanders revolucionaram os estudos sobre a teologia paulina quando, em 1977, publicou seu livro Paulo e 0 Judaísmo Palestino.6 Sanders parte do princípio de que o judaísmo não era uma religião legalista que pregava a salvação pelas obras. Esse pensamento de Sanders, denominado de A. Nova Perspectiva sobre Paulo, é radicalmente oposto àquele da tradição cristã histórica. O livro de Sanders é uma tentativa de provar que a teologia sobre Paulo, que os reformadores defendiam, não era de fato de Paulo, mas de Agostinho, bispo de Elipona. O escritor William S. Campbell destaca que “é perceptível, pela leitura de Sanders, que um debate cristão interno posterior sobre a graça e obras foi projetado no cristianismo inicial, fazendo com que nosso entendimento das origens cristãs, em relação ao judaísmo, se tornasse um tanto distorcido. Em certo sentido, esse é, na verdade, mais um debate sobre a graça dentro do cristianismo. E esclarecedor observar que foram

os escritos antipelagianos de Agostinho o material que Lutero considerou mais úteis. Para Lutero, Agostinho é sua autoridade preferida, seu principal aliado na luta contra as tendências pelagianas do escolasticismo. Mas, em decorrência disso, os judeus são vistos por Lutero como representantes de um tipo de pelagianismo e, como tal, inimigos do Evangelho tanto quanto a igreja não reformada”.7
Partindo, portanto, desse princípio, E. P. Sanders se opôs a essa visão dos reformadores. Ao contrário do que crê o cristianismo tradicional, disse que o judaísmo é uma religião da aliança em que o status de pertencer ao grupo eleito, e não a obediência legalista da lei, é a principal característica. Para Sanders, os judeus não acreditavam que a obediência aos preceitos legais lhes garantia salvação, mas apenas mantinha seu status dentro do grupo da aliança. Nesse aspecto, em vez de ser a causa da salvação, a obediência era apenas a condição. Essa nova perspectiva, Sanders denominou de nomismo da aliança. Em outras palavras, o erro dos judeus era o de se orgulhar de pertencer ao povo eleito de Deus, pertencer a aliança que Deus fez com Israel e não querer agradá-lo por meio das obras.8
Outro autor que fez coro com Sanders foi o britânico James D. G. Dunn que também passou a defender a Nova Perspectiva sobre Paulo. Todavia, Dunn fez críticas ao modelo de Sanders para implantar o seu próprio modelo. Dunn afirma que “o Paulo luterano foi substituído por um Paulo idiossincrático que, de maneira arbitrária e irracional, volta-se contra a glória e a grandeza da teologia pactuai do judaísmo e abandona o judaísmo simplesmente por que ele não é cristianismo”.9 O teólogo presbiteriano Augustas Nicodemus observa que J. D. G. Dunn nessa nova abordagem sociológica sobre Paulo “tem recebido vasta aceitação. Para ele, Paulo ataca as ‘obras da lei’ não porque elas expressam algum desejo de alcançar mérito por parte dos judeus, mas porque entende que elas fazem uma distinção entre os judeus, o povo de Deus da antiga dispensação, e os gentios, a quem o evangelho está sendo oferecido. As ‘obras da lei’, que Paulo identifica como restritas à circuncisão, às leis sobre alimentos puros e impuros (kashruí) e aos dias especiais do calendário judaico, são emblemas que caracterizam o judaísmo e devem ser rejeitadas porque enfatizam a separação entre judeus e não judeus, a qual Cristo veio abolir”.10
Duas coisas precisam ser observadas aqui. Primeiro, a leitura de Romanos 3.28 mostra claramente que Paulo não via o problema da rejeição judaica apenas como sendo um orgulho de pertencer ao povo da aliança. Essa

Escritura é clara o suficiente para mostrar que a busca pelo mérito por meio das obras constituiu-se o principal obstáculo para um judeu legalista aceitar a justificação somente pela fé. Em segundo lugar, é um fato que não apenas Lutero, mas outros reformadores depois dele, beberam do poço doutrinário de Agostinho, como por exemplo, a crença no pecado original com a consequente doutrina da regeneração batismal, etc. Embora haja similaridade entre o legalismo judaico e a doutrina da salvação pelas obras de Pelágio, não é correto fazer a crença luterana na justificação pela fé depender exclusivamente de Agostinho. Não há como negar que Lutero foi influenciado de forma negativa por Agostinho, todavia, a própria história da Reforma, com seu lema “O justo viverá pela fé” (Rm 1.17), revela a grande influência que a Carta aos Romanos teve na vida e obra do reformador alemão. Não é seguro, portanto, pelo menos neste caso, fazer a convicção teológica do reformador alemão depender somente de Agostinho. Por outro lado, é certo e historicamente provado, como demonstrou Sanders, que Lutero errou ao odiar os judeus ao projetar neles o erro pelagiano.
Romanos 4.1-25
Que diremos, pois, ter alcançado Abraão, nosso pai segundo a carne? Porque, se Abraão foi justificado pelas obras, tem de que se gloriar, mas não diante de Deus. Pois, que diz a Escritura? Creu Abraão em Deus, e isso lhe foi imputado como justiça. Ora, àquele que faz qualquer obra, não lhe é imputado o galardão segundo a graça, mas segundo a dívida. Mas, àquele que não pratica, porém crê naquele que justifica o ímpio, a sua fé lhe é imputada como justiça. Assim também Davi declara bem-aventurado o homem a quem Deus imputa a justiça sem as obras, dizendo: Bem-aventurados aqueles cujas maldades são perdoadas, e cujos pecados são cobertos. Bem-aventurado o homem a quem o Senhor não imputa o pecado. Vem, pois, esta bem-aventurança sobre a circuncisão somente ou também sobre a incircuncisão? Porque dizemos que a fé foi imputada como justiça a Abraão. Como lhe foi, pois, imputada? Estando na circuncisão ou na incircuncisão? Não na circuncisão, mas na incircuncisão. E recebeu o sinal da circuncisão, selo da justiça da fé, quando estava na incircuncisão, para que fosse pai de todos os que creem (estando eles também na incircuncisão, a fim de que também a justiça lhes seja imputada), e fosse pai da circuncisão, daqueles que não somente são da circuncisão, mas que também andam nas pisadas daquela fé de Abraão, nosso pai, que tivera na incircuncisão. Porque a promessa de que havia de ser herdeiro do mundo não foi feita pela lei a Abraão ou à sua posteridade, mas pela justiça da fé. Pois, se os que são da lei são os herdeiros, logo a fé é vã e a promessa é aniquilada. Porque a lei opera a ira; porque onde não há lei também não há transgressão. Portanto, é pela

fé, para que seja segundo a graça, a fim de que a promessa seja firme a toda a posteridade, não somente à que é da lei, mas também à que é da fé de Abraão, o qual é pai de todos nós, (como está escrito: Por pai de muitas nações te constituí.), perante aquele no qual creu, a saber, Deus, o qual vivifica os mortos e chama as coisas que não são como se já fossem. O qual, em esperança, creu contra a esperança que seria feito pai de muitas nações, conforme o que lhe fora dito: Assim será a tua descendência. E não enfraqueceu na fé, nem atentou para o seu próprio corpo já amortecido (pois era já de quase cem anos), nem tampouco para o amortecimento do ventre de Sara. E não duvidou da promessa de Deus por incredulidade, mas foi fortificado na fé, dando glória a Deus; e estando certíssimo de que o que ele tinha prometido também era poderoso para o fazer. Pelo que isso lhe foi também imputado como justiça. Ora, não só por causa dele está escrito que lhe fosse tomado em conta, mas também por nós, a quem será tomado em conta, os que cremos naquele que dos mortos ressuscitou a Jesus, nosso Senhor, o qual por nossos pecados foi entregue e ressuscitou para nossa justificação.
A Jornada da Fé
A partir dessa seção, Paulo introduz a história do patriarca Abraão com um exemplo do seu argumento da justificação pela fé. Paulo argumenta a partir de Gênesis 15; todavia, acredito ser oportuno aqui vermos alguns aspectos anteriores da jornada desse gigante espiritual. Voltemo-nos, pois, ao capítulo 13 de Gênesis para traçarmos o percurso dessa jornada.
/. Uma jornada para conviver com altares, e não com pirâmides. “Subiu, pois, Abrão do Egito [a terra das pirâmides] [...] E fez as suas jornadas do Sul [Neguebe] até Betei, até ao lugar onde, ao princípio, estivera a sua tenda, entre Betei e Ai; até ao lugar do altar que, dantes, ali tinha feito; e Abrão invocou ali o nome do Senhor” (Gn 13.1-4).11 Abraão saiu do Egito, onde conviveu com as grandes pirâmides, para voltar à Palestina, terra onde construíra altares. Deus quer o fiel convivendo com altares, e não com pirâmides.
2. Uma jornada onde a visão deve ser maior do que a ambição. “E houve contenda entre os pastores do gado de Abrão e os pastores do gado de Ló [...] E disse Abrão a Ló: Ora, não haja contenda entre mim e ti e entre os meus pastores e os teus pastores, porque irmãos somos” (Gn 13.7,8). A ambição, o orgulho e o desejo de ter são agentes causadores da quebra da unidade fraternal, mas a busca da

koinonia é o remédio para esse mal. A luta por espaço arranhou o relacionamento entre os pastores de Abraão e Ló. Evidentemente que isso estava tendo consequências entre o tio e o sobrinho. E melhor abrir mão de alguma coisa do que permitir que venha a arranhar a comunhão fraternal.
3. Uma jornada que não pode ser seduzida por uma imitação do Paraíso nem pelas lembranças do Egito. “E levantou Ló os seus olhos e viu toda a campina do Jordão, que era toda bem regada, antes de o Senhor ter destruído Sodoma e Gomorra, e era como o jardim do Senhor, como a terra do Egito, quando se entra em Zoar” (Gn 13.10). Ló se deixou seduzir por uma lembrança do Paraíso, todavia Abraão procurou viver a realidade nua e crua de uma vida de fé. As campinas de Sodoma lembravam o Paraíso, mas não eram o Paraíso. Às vezes, o crente se deixa iludir pelas aparências e em vez de procurar o caminho mais seguro, busca os atalhos.
4. Uma jornada que se aproxima de Canaã e se afasta de Sodoma. “Habitou Abrão na terra de Canaã, e Ló habitou nas cidades da campina e armou as suas tendas até Sodoma” (Gn 13.12,13). Enquanto Ló se aproximava de Sodoma, do pecado, Abraão se distanciava cada vez mais dele. Impulsionado pelos atrativos, Ló se aproximava cada vez mais dos encantos de Sodoma. Foi uma sedução que, posteriormente, lhe custou muito caro. Por que em vez de se afastar de Sodoma muitos se aproximam cada vez mais?
5. Uma jornada onde a exclusividade determina a intimidade. “E disse o Senhor a Abrão, depois que Ló se apartou dele” (Gn 13.14). Às vezes precisamos nos separar de determinadas coisas, até mesmo de pessoas, se queremos ouvir a voz do Senhor. Não dá para conviver com quem gosta de Sodoma.
6. Uma jornada onde Deus mostra 0 futuro, mas é 0 homem quem constrói 0 presente. “Levanta, agora, os teus olhos e olha desde o lugar onde estás, para a banda do norte, e do sul, e do oriente, e do ocidente; porque toda esta terra que vês te hei de dar a ti e à tua semente, para sempre. [...] Levanta-te, percorre essa terra, no seu comprimento e na sua largura; porque a ti a darei. E Abrão armou as suas tendas, e veio, e habitou nos carvalhais de Manre, que estão junto a Hebrom; e edificou ah um altar ao Senhor” (Gn 13.14-18). Deus revela o

futuro, mas somos nós quem construímos o presente. É preciso haver deslocamento. Começar e recomeçar sempre. Deus faz promessas e as cumpre, mas é preciso ter paciência, encarar as incertezas do presente para chegar às garantias do futuro.
7. Uma jornada onde pessoas são mais importantes do que coisas. “Também tomaram a Ló, que habitava em Sodoma, filho do irmão de Abrão, e a sua fazenda e foram-se. [...] não tomarei coisa alguma de tudo o que é teu; para que não digas: Eu enriqueci a Abrão” (Gn 14.12,23). Abraão era rico, mas não punha nas riquezas a sua confiança. O importante para ele era a comunhão com o seu Deus.
8. Uma jornada onde Abrão aprendeu que era grande, mas não o maior. “E Melquisedeque, rei de Salém, trouxe pão e vinho; e este era sacerdote do Deus Altíssimo. E abençoou-o e disse: Bendito seja Abrão do Deus Altíssimo, o Possuidor dos céus e da terra; e bendito seja o Deus Altíssimo, que entregou os teus inimigos nas tuas mãos. E deu-lhe o dízimo de tudo” (Gn 14.18,20; Hb7.1-10). Mesmo sendo um homem grande, Abraão reconheceu que havia alguém ainda maior. Melquisedeque é um tipo de Cristo, e o velho patriarca aprendeu desde sempre a depender da fé nEle.
Pois bem, voltemos ao texto.
O texto de Romanos 4.1-25, como vimos, trata com exclusividade da vida do velho patriarca Abraão. A exegese feita por Paulo nessa passagem mostra, a partir do livro de Gênesis, que a justificação de Abraão não se deu em decorrência das obras, mas da fé. Nesse aspecto há uma similaridade entre a fé de Abraão e a fé do cristão. Lucien Cerfaux sintetizou bem essa analogia usada por Paulo.12 Dentro dessa passagem de Romanos é possível perceber com clareza Paulo fazendo a ligação entre a justiça de Abraão, Cristo e a justiça do cristão.
“Pois, que di% a Escritura? Creu Abraão em Deus, e isso lhe foi imputado como justiça” (Km 4.3). Paulo toma como ponto de partida de seu argumento Gênesis 15.6, onde Deus fez a promessa a Abrão de lhe dar uma posteridade numerosa. O judaísmo acreditava que Abraão havia sido justificado em consequência do rito da circuncisão, o que Paulo vai negar. Paulo observa que Deus justificou o patriarca em consequência da sua fé, que aconteceu muito antes da prática da

circuncisão. Dessa forma, como mostra Romanos 4.4, Abraão não poderia ter sido justificado pelas obras, mas pela fé. A sua justificação foi uma dádiva, e não uma dívida.
O expositor Lucien Cerfaux destaca que “Paulo exalta a fé de Abraão, emoldurando-a de maneira mais determinada com a fé dos cristãos, cujo objeto principal é a ressurreição de Cristo. Abraão crera em Deus ‘que dá vida aos mortos e, chamando-as, faz existir as coisas que não existiam’ (Rm 4.17). Paulo explica seu modo de pensar: ‘E sem vacilar na fé, não considerou nem o seu corpo, já sem vitalidade, por ser quase centenário, nem a falta de vigor do seio de Sara; nem hesitou por falta de fé, perante a promessa de Deus, antes hauriu força na sua fé, dando gloria a Deus’ (Rm 4.19). Notem-se as expressões ‘morte’ (o corpo de Abraão, o seio de Sara estão mortos) e ‘dar vida’. É a antítese morte-ressurreição. A fé de Abraão constitui o primeiro esboço da fé cristã; pela maneira com a qual a formula, suspeita-se que Paulo a encara como um ‘tipo’ de fé na morte e ressurreição de Cristo”.13
“Bem-aventurado 0 homem a quem 0 Senhor não imputa 0pecado” (Rm 4.8). Seguindo um dos princípios hermenêuticos (Ge^erah Sahawah) da escola rabínica de Hillel, faz um paralelo entre Salmos 32.1 e Gênesis 16.6. O propósito do apóstolo é interpretar Gênesis 15a partir do Salmo 32. “O fato de Abraão ter sido considerado justo, de ter-lhe sido atribuída justiça diante de Deus (Gn 15.6), significa que Deus não contou, atribuiu seus pecados contra ele (SI 32.1,2), com referência ao perdão divino dos pecados de adultério e homicídio cometidos por Davi [cf. 2 Sm 11]. Tudo isso significa que Abraão foi justificado diante de Deus, pela fé e não por obras. De fato, Abraão era um pecador cuja única esperança era a graça de Deus recebida pela fé”.14
Na argumentação de Paulo, ficam, portanto, os fatos:
1. Quando Abraão foi justificado, era ainda incircunciso. Isso significa que Abraão seria o pai de todos os que haviam de crer sem estar circuncidados (incircuncisos), e assim fosse creditada a justiça também a eles.
2. A circuncisão foi dada após, como “sinal” (segundo Gn 17.1Oss), isto é, como sinal da justiça da fé que ele havia recebido sendo ainda incircunciso. Isso significa que Abraão seria o pai de todos circuncisos, isto é, daqueles que não se limitam à circuncisão, mas que, além disso, seguem na esteira da fé que, ainda incircunciso, possuía nosso pai Abraão (Rm 4.11).

SUBSÍDIO LIÇÃO 3/ 2ºTRIMESTRE 2016- JUSTIFICAÇÃO, SOMENTE PELA FÉ EM JESUS CRISTO


   Para explicar a doutrina da Justificação pela Fé, o apóstolo Paulo usa dois tipos de linguagem na carta: a do judiciário e a do sistema de sacrifício levítico. Como o apóstolo pretende convencer o seu público leitor, os judeus, bem como os gentios, que mais do que o observar o sistema de Lei como requisito para a salvação, Deus havia manifestado a sua graça justificadora lá no tempo da Antiga Aliança por intermédio do pai da fé, Abraão. Logo, o apóstolo afirmaria com todas as letras: "Portanto, é pela fé, para que seja segundo a graça, a fim de que a promessa seja firme a toda a posteridade, não somente à que é da lei, mas também à que é da fé de Abraão, o qual é pai de todos nós. [...] Pelo que isso lhe foi também imputado como justiça" (Rm 4.16,22). Desta forma o apóstolo argumentava ao judeu de que, pelo motivo do gentio ainda não ter a Lei, a condição do gentio em relação a Deus em nada é inferior ao do judeu. Em Jesus, pela fé mediante a Graça de Deus, o gentio é filho de Abraão por intermédio da fé, que é pai tanto do judeu quanto do gentio achado por Deus (Rm 4.9-13).

A linguagem judiciária da Justificação

   Ser justificado por Deus é ser inocentado por Ele mesmo da condição de culpado pelos atos. Ou seja, o indivíduo não tem quaisquer condições de se autodeclarar inocente ou de aliviar a sua consciência, pois sabe que nada poderá apagar a sua culpa. Por isso, Deus, em Cristo, na cruz do Calvário, nos reconciliou para sempre (2 Co 5.19). De modo que o apóstolo Paulo ratifica esse milagre: "Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isso não vem de vós; é dom de Deus" (Ef 2.8).

A linguagem sacrifical da Justificação

   Trocar o culpado pelo inocente. O sangue de Jesus Cristo foi derramado no lugar do sangue da humanidade. Foi a substituição vicária de Cristo Jesus por nós. Éramos os culpados, Cristo se tornou culpado por nós; éramos malditos, Cristo se tornou maldito por nós; éramos dignos de morte, Cristo morreu em nosso lugar e por nós (Rm 3.25).
   A linguagem judiciária e sacrifical da justificação nos mostra um Deus amoroso e misericordioso, que não faz acepção de pessoas e que deixa clara a real condição do ser humano, seja ele judeu ou gentio: somos todos carentes da graça e da misericórdia do Pai.
Caro professor, esse trecho bíblico [3.1-4.25] é importante para o desenvolvimento do argumento do apóstolo em sua epístola. Estude-o com rigor.